quinta-feira, 24 de julho de 2014

UMA MÁ POLÍTICA DE CONFRONTO PERSISTENTE


  1. O que se passa actualmente na Faixa de Gaza é simplesmente inadmissível e a comunidade internacional ainda não fez o suficiente para pôr cobro à barbárie que lá se assiste.

 

  1. Quem, ainda assim, consegue permanecer indiferente ao presente massacre praticado por Israel, só pode estar movido por um ódio irracional aos palestinianos, ou e então, à religião que eles, maioritariamente, professam.

 

  1. Não posso, pois, deixar de manifestar aqui a minha profunda indignação e revolta. E devo desde já dizer, que também me indignaria e revoltaria, caso o massacre estivesse a ser de sinal contrário, ou seja, se fossem os palestinianos a massacrar o povo de Israel.

 

  1. Reconheço que a má imagem sistematicamente deixada passar pelos radicais islâmicos tem contribuído para que, em relação a eles, se nutra um forte sentimento de repulsa. Porém, e por alguma imprecaução, há quem estenda tal sentimento de repulsa à totalidade dos islâmicos, confundindo, assim, uma parte com o todo.

 

  1. Mas, há radicais em todas as dimensões da vida, em especial na política e, sobretudo, em todas as religiões. Vai daí que, em nome da política e da religião, se pratiquem os actos mais bárbaros e irracionais que hoje se conhecem. É verdade que sempre foi assim ao longo da história da humanidade.

 

  1. Ao povo de Israel ligam-me laços históricos de sangue, uma das minhas bisavós, Maria das Dores, era judia. Ao povo da Palestina, ou ao mundo árabe em geral – pelo menos que eu saiba – não me ligam quaisquer laços de sangue. O que não é bastante para me tornar insensível ao seu drama. Sou tão sensível ao actual drama dos palestinianos, como sempre fui ao que envolveu os judeus no passado.

 

  1. O facto de correr sangue judeu nas minhas veias não me impele a ser solidário com as actuais práticas do governo de Israel. É até sabido que mesmo judeus israelitas já se vão demarcando das opções belicistas do presente governo de Israel.

 

  1. De modo algum estou de acordo com os apologistas da retirada do mapa do Estado de Israel. Também de modo algum concordo com os métodos seguidos pelos sucessivos governos israelitas que procuram, de uma forma ou de outra, torpedear o estabelecimento de um Estado viável para os palestinianos. Qualquer uma destas opções extremas resulta, afinal, de equívocos históricos, alguns dos quais facilmente explicados.

 

  1. O grande equívoco começou quando, pretendendo encontrar um espaço adequado para instalar os judeus perseguidos – e quase exterminados pela sanha assassina dos nazis – foram subvalorizados os anseios e os legítimos direitos dos palestinianos que habitavam os territórios hoje integrados em Israel.

 

  1. O Mandato Britânico sobre o território da Palestina – outorgado pela Liga das Nações, em 1922, na sequência da derrota do Império Otomano – terminou a 14 de Maio de 1948. David Ben-Gurion declarou, então, a independência do Estado de Israel, uma declaração imediatamente reconhecida pelos Estados Unidos da América e pela então União Soviética, potências saídas vitoriosas no final da II Guerra Mundial.

 

  1. Na tentativa de resolver um problema – ou seja, arranjar um espaço viável e aparentemente seguro para os judeus – as grandes potências criaram, afinal, um outro problema não menos grave: lançaram para a diáspora milhares e milhares de palestinianos, despoletando, assim, um conjunto de estímulos ao conflito entre árabes e israelitas prevalecente nos nossos dias.

 

  1. As sucessivas vitórias militares de Israel sobre os seus vizinhos árabes permitiu o início de um processo expansionista que ainda perdura. O território da Palestina ficou também privado de espaços ocupados quer pela Jordânia (Cisjordânia), quer pelo Egipto (Faixa de Gaza).

 

  1. No decurso da Guerra Israelo-árabe de 1967 – a chamada “guerra dos seis dias” – Israel tomou aos estados árabes territórios como a Cisjordânia e Jerusalém Oriental (tomadas à Jordânia), a Faixa de Gaza e a Península do Sinai (tomadas ao Egipto), e à Síria tomou os Montes Golã.

 

  1. Em 2005, por iniciativa do então Primeiro-Ministro Ariel Sharon, Israel retirou-se da Faixa de Gaza e da Cisjordânia. Posteriormente, optou por se retirar também dos Montes Golã, tendo, no entanto, e quase que em simultâneo, lançado uma poderosa ofensiva contra a Faixa de Gaza, o local onde hoje se desenvolvem as maiores atrocidades, atingindo especialmente a população civil.

 

  1. Ao longo do tempo, a opção israelita tem sido a de se expandir para dentro do território da Cisjordânia, através de colonatos de judeus que a descaracterizam e inviabilizam.

 

  1. Os colonatos judeus que se espalham por todo o território da Cisjordânia são focos permanentes de tensão entre o campo palestiniano e os judeus. A garantia de segurança do seu Estado é também o argumento de recurso para justificar os ataques levados a cabo por Israel contra os seus vizinhos e contra os radicais palestinianos.

 

  1. Trata-se de um conflito que acompanho há muito e que, penso, só terá fim quando for possível uma coexistência pacífica e cooperativa entre o Estado de Israel e os Palestinianos unidos eles também no seu próprio Estado, pois a opção pelo confronto persistente não pode durar uma eternidade.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

O BLOCO DEMOCRÁTICO E A ADESÃO DA GUINÉ-EQUATORIAL À CPLP


  1. Desde 2006 que a Guiné-Equatorial beneficia do estatuto de País Observador no seio da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

 

  1. No ano 2010, a Guiné-Equatorial pediu oficialmente para alterar o presente estatuto para a condição de Membro de Pleno Direito, com todas as regalias e obrigações outorgadas aos restantes países membros.

 

  1. As reuniões Cimeiras da CPLP realizadas em Luanda e em Maputo, condicionaram a alteração do seu estatuto ao cumprimento de uma Moratória sobre a pena de morte, e também a promoção da Língua Portuguesa.

 

  1. Recentemente, aquele país anunciou a suspensão da pena de morte – e não a sua abolição, como é norma nos restantes países da organização – assim como um conjunto de medidas tendentes à promoção e desenvolvimento da Língua Portuguesa no seu território. Para o cumprimento desta última condição, a Guiné-Equatorial anunciou que inseriu na sua Constituição o uso da Língua Portuguesa, em parceria com o Espanhol (primeira Língua) e o Francês (segunda Língua).

 

  1. Essas são questões apenas formais que condicionaram até agora a adesão da Guiné-Equatorial à CPLP. Todavia, é bem sabido que esse país se caracteriza por um conjunto de práticas nada abonatórias para a sua imagem pública, nomeadamente, a corrupção generalizada, sistematicamente o recurso a prisões arbitrárias, julgamentos injustos, limitação da liberdade de imprensa, de reunião e de manifestação, sujeitando o seu povo a uma das ditaduras mais horrendas que hoje se conhece.

 

  1. Os objectivos iniciais que ditaram a constituição da CPLP tinham como baliza o desenvolvimento da cooperação entre os diversos Estados e Povos, com vista à melhoria das suas relações e condições de vida.

 

  1. Hoje é perfeitamente visível que a tónica do nosso relacionamento no seio da organização sobrevaloriza a dimensão económica, relegando para plano secundário as restantes dimensões da vida, em especial o compromisso com o desenvolvimento democrático e o respeito pelos direitos humanos. Veja-se que o filho do Presidente assumiu uma Vice-Presidencia que não vem descrita na Constituição e que o Poder judicial está todo completamente subordinado ao Presidente, condenando sem provas, quem o presidente determinar.

 

  1. O Bloco Democrático não subalterniza os interesses económicos que se estabelecem entre os Estados e os Povos, mas acha que o bem-estar social só pode ser efectivo e duradouro quando tem alicerces firmes no usufruto das liberdades fundamentais, sendo os direitos humanos o seu pilar basilar. E, entre essas liberdades, se inclui a transparência dos negócios, o que não existe na Guiné Equatorial, onde tudo anda à roda da família do Presidente. Para se fazer negócios nesse país é, inclusive, preciso pagarem-se grandes “luvas” à elite presidencial e aceita todas as formas de corrupção.

 

  1. O Bloco não aconselha os empresários angolanos honestos a investirem na Guiné Equatorial, pois poderão estar sujeitos a prisões arbitrárias com torturas (como a que ocorre com o empresário Italiano Roberto Berardi que tem negócios com o filho do Presidente), ou a assassinato não esclarecido (como o de Igor Celotti, em 2007). O “El Dourado Equato-guineense” é, pois, um verdadeiro “presente envenenado” que deve ser evitado.

 

  1. A posição do Bloco Democrático a respeito do pedido de adesão plena da Guiné-Equatorial à CPLP é de que ela deverá continuar condicionada ao fim da ditadura que é efectiva nesse país.

 

  1. Contrariamos, assim, a posição assumida, em Fevereiro deste ano, pelos Ministros de Negócios Estrangeiros dos países da Comunidade, incluindo o nosso, que fingem desconhecer a situação real, ignorando os gritos do povo Equato-guineense e os relatórios das organizações internacionais de Direitos Humanos. E recomendamos vivamente aos Chefes de Estado dos países da Comunidade para evitarem lançar os seus povos numa aventura desprestigiante por excesso de economicismo.

 

  1. Somos, pois, de opinião que todos os passos dados até agora pelo regime ditatorial de Teodoro Obiang Nguema visam somente lavar a sua imagem pública e ganhar uma legitimidade internacional que de modo algum merece.

 

  1. Por isto, alguns dirigentes do Bloco Democrático, em que eu próprio estou incluído juntamente com outras personalidades do espaço da CPLP, subscreveram um “Abaixo-Assinado” contra a entrada da Guiné Equatorial na CPLP, que esperamos seja tomada em consideração pela presente Cimeira.