quinta-feira, 6 de junho de 2019

NÃO SEI COMO SER OPTIMISTA


1.  O OGE-Revisto prevê um crescimento económico de 0,3%, número contestado pelas principais agências internacionais, afirmando que o crescimento será negativo, alertando para a aproximação de um período de alto risco social. É indubitável que o nosso país necessita de crescer de modo sustentável a uma taxa acima de crescimento demográfico, 3%.



Os preços internacionais do petróleo têm sido desfavoráveis, acrescendo-se a isso reduzidos níveis da produção, devidos, essencialmente, aos fracos investimentos realizados no sector e o envelhecimento natural dos campos mais antigos.



O OGE-Revisto para 2019 perspectiva uma redução em 38% no Programa de investimento Público, com excepção do investimento no sector dos Petróleos. A componente privada no investimento total será ainda muito fraca.



2.  É verdade que o Governo tem recebido sucessivos aplausos públicos de instituições internacionais, como o FMI e o Banco Mundial. Porém, são essas mesmas agências que não se cansam de dizer que, para que o processo de viragem se tornar consistente, Angola deverá proceder a reformas estruturais capazes de atrair mais e, sobretudo, bons investimentos privados.



É fundamental a reforma no sector judicial, para o tornar transparente e mais célere, bem como a melhoria da Lei da Propriedade e da Lei de Terras que, presentemente, não servem para realizar hipotecas para os financiamentos. Deve, igualmente, fazer-se acertos na política monetária e cambial, para estabilizar as variáveis macroeconómicas e facilitar a movimentação do capital para quem investe em Angola.



3.  As actuais políticas governamentais afiguram-se, pois, contraditórias: i) por um lado, “empurram” os bancos a conceder mais crédito à economia; ii) mas, por outro lado, aplica-se uma política monetária e cambial muito restritiva que dificulta os créditos privados.



Um dos aspectos que se afiguram contraditórios na política monetária e cambial é o aumento pelo BNA do nível das reservas obrigatórias pelos bancos comerciais e também dos cativos para as transferências para o exterior.



Na verdade, a política monetária e cambial “asfixiou” a economia, diminuindo a capacidade de transações das empresas, com frequentes encerramentos das suas portas, aumentando o desemprego.



4.  No curto prazo, a aplicação do IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) aumentará os preços dos bens e dos serviços. Adicionando-se, agora, a retirada dos subsídios aos combustíveis, e o anunciado aumento das tarifas de água e de energia, estão criadas as condições para, logo de seguida, assistirmos ao agravamento das condições sociais da população.



5.  O governo propala um especial cuidado com os sectores sociais, porém, os investimentos aí realizados até agora são demasiado insuficientes.



6.  A presente geografia do crescimento demográfico, centrado essencialmente em Luanda e em algumas das restantes grandes cidades, é responsável pelo aumento do Risco de Insegurança: penúria alimentar, crescimento do desemprego urbano, degradação dos níveis de saúde e o inquestionável aumento dos índices de criminalidade.



7.  A agressiva política de desvalorização da nossa moeda tem tido profundos reflexos no poder aquisitivo da população, onerando as importações e o investimento privado.



No curto e mesmo no médio prazo, as Exportações não aumentarão, pois a nossa pauta exportadora quase que se limita ao petróleo, e o Investimento Directo Estrangeiro promove a entrada de capitais, mas, também se traduz numa maior dependência do capital externo.



Não há, pois, condições para ser optimista e acreditar no êxito do OGE-Revisto 2019!



JUSTINO PINTO DE ANDRADE (06/06/2019)

(REVISTA ECONOMIA & MERCADO)

quinta-feira, 12 de maio de 2016

NOVAS DESCOBERTAS NÃO SERÃO SEMPRE MAIS RIQUEZA


1.  No dia 13 de Abril deste ano, a Sonangol anunciou a descoberta, nas bacias do Kwanza e do Congo, de novas reservas de petróleo e gás natural que podem comportar 2,2 mil milhões de barris de óleo equivalente. A confirmarem-se tais previsões, Angola poderá atingir a almejada meta de produção de 2 milhões de barris de petróleo/dia, contra os actuais 1,8 milhões de barris/dia. Ouvi essa notícia - embora deformada – numa das rádios locais.



2.  A notícia soou-me “deformada”, pelo facto de, na sua transmissão, ter-se confundido volume do depósito com capacidade de produção diária dos poços, dois conceitos muito distintos, pois, uma coisa é o volume das reservas descobertas, ou seja, a quantidade que se estima estar depositada nos poços, e outra é a produção diária dos poços.



3.  No comunicado da Sonangol apenas se fez referência às expectativas do potencial dos dois poços localizados na bacia do Kwanza, nomeadamente, o Lontra - 1, do bolco 20/15, com uma estimativa de 570 milhões de barris de óleo equivalente, e o Katambi -1, do bloco 24/11, com uma estimativa de 1,7 mil milhões de barris de óleo equivalente. Sobre o potencial poço da bacia do Congo, o Lira – 1, do bloco 15/14, nada foi dito.



4.  Nos últimos anos, tem sido constante o anúncio de novas descobertas de petróleo e gás natural no nosso país. Por exemplo, em 2014, a Sonangol deu especial àquilo a que chamou “a maior descoberta de petróleo” na camada do pré-sal da bacia do Kwanza. Tratou-se do poço Orca, do bloco 20/11, numa profundidade de mais de 3.800 metros, capaz de produzir 3.700 barris de petróleo/dia e 16,3 milhões de metros cúbicos de gás. O bloco 20/11 é operado pela Cobalt, que detém 40% do capital, sendo os restantes 60% repartidos em partes iguais pela Sonangol e pela multinacional britânica BP.



5.  A tecnologia de perfuração dos poços de petróleo evoluiu muito ao longo do tempo, ao ponto de ter desvendado um enorme potencial existente nas camadas do pré-sal, o que gerou sonhos de maior riqueza não só em Angola mas, muito particularmente, no Brasil, onde se situam dos seus maiores reservatórios. Vivia-se, ainda, a época dos preços altos.



6.  As mais recentes descobertas de petróleo e gás natural em Angola situam-se, precisamente, em camadas cada vez mais profundas, facto que encarece demasiado os custos de produção.



7.  Dados os actuais preços vigentes nos mercados internacionais, quer para o crude, quer para o gás, não é, pois, de estranhar que nos questionemos sobre o real impacto dessas novas descobertas na nossa economia. Isto é, se as novas jazidas agora festejadas contribuirão significativamente, ou não, para a saída da crise económica que hoje atravessamos – uma crise que já não tem hipóteses de ser disfarçada.



8.  Recordo que o crude representa 97% das nossas receitas de exportação e cerca de 80% das receitas fiscais. A manterem-se os preços relativamente baixos que hoje conhecemos, qual será, então, o real impacto das novas descobertas?



9.  Fruto da má conjuntura actual, a tendência será para um aumento do nosso endividamento, numa dívida saldada por via das receitas de exportação. Não seria, pois, interessante avaliarmos, comparativamente, a velocidade de crescimento da nossa dívida, com a velocidade do acréscimo das receitas geradas pelas novas descobertas?



10.                  Não será que a presente geração de angolanos está apenas a exaurir boa parte dos recursos naturais que o nosso país possui, sem, contudo, deixar para os angolanos que virão depois de nós, uma estrutura económica que lhes garanta sustentabilidade?

terça-feira, 5 de abril de 2016

UMA DUALIDADE QUE PREJUDICA A INTEGRAÇÃO SUB-REGIONAL


1.  Há relativamente pouco tempo, alguém me questionou sobre o porquê de Angola estar, simultaneamente, inserida em dois blocos de integração sub-regional: a SADC (Comunidade de Desenvolvimento da África Austral), criada em 1992, pelo Tratado de Windhoek, e a CEEAC (Comunidade Económica dos Estados da África Central), surgida, formalmente, em 1981, em Libreville, mas apenas operacionalizada em 1985.



2.  Comecei por responder que, de início, poderá ter havido alguma hesitação por parte das autoridades angolanas, dado que o norte e o nordeste do nosso país fazem parte, claramente, da África Central, enquanto o sul e o sudeste são, indubitavelmente, territórios da África Austral. Pode ter sido esse o motivo que nos levou a pôr um pé em cada uma dessas duas posições. Somos, de facto, um país de transição sub-regional.



3.  A SADC é, nem mais nem menos, que uma evolução política da SADCC (Conferência de Coordenação e Desenvolvimento da África Austral), instrumento sub-regional nascido em 1980, inspirado no espírito dos “Países da Linha da Frente” que apoiavam directamente a luta contra o regime do Apartheid e se opunham à hegemonia da África do Sul, apostada, na altura, na criação de uma suposta “Constelação de Estados”, com “Bantustões” pseudo-independentes. O fim do Apartheid, em 1990, permitiu colocar ponto final neste projecto, e a emergência da SADC, incorporando a própria África do Sul.



4.  Mas, vale a pena recordar o quadro de países integrantes quer da SADC, quer da CEEAC. Na SADC estão a África do Sul, Angola, Botswana, República Democrática do Congo, Lesotho, Madagáscar, Malawi, Ilhas Maurícias, Moçambique, Namíbia, Swazilândia, Tanzânia, Zâmbia, Zimbabwe, Seicheles. Por sua vez, na CEEAC estão o Burundi, Camarões, República Centro Africana, Chade, Congo, Guiné Equatorial, Gabão, Ruanda, São Tomé e Príncipe, República Democrática do Congo (RDC) e Angola. Como vemos, Angola e a RDC  repetem-se em ambos blocos.



5.  As repetições de países acontecem, igualmente, em outros blocos sub-regionais. Dos 15 países da CEDEAO (Comunidade Económica de Desenvolvimento de Estados da África Ocidental), 7 também são membros da UEMOA (União Económica e Monetária dos Estados da África Ocidental), partilhando o franco CFA. Na própria SADC, 5 países - África do Sul, Namíbia, Botswana, Lesotho e Suazilândia – constituíram já uma União Aduaneira, a SACU (Southern African Customs Union), uma espécie de Bloco Central. E 7 países da SADC integram a COMESA (Common Market for Eastern and Southern África), um total de 21 países que se pretendem constituir em União Aduaneira.



6.  Eu não vejo como se possa evoluir nesse sentido, sem que haja uma escolha única, definitiva e inequívoca por parte de cada país, pois as actuais dualidades inviabilizam o desenvolvimento das organizações sub-regionais, violando, mesmo, regras basilares da Organização Mundial do Comércio (OMC).



7.  Em termos económicos, Angola está claramente mais próxima da África Austral do que da África Central. Os países da SADC estão a desenvolver projectos comuns nos domínios das infraestruturas rodoviárias, ferroviárias, de energia e água, também de promoção do turismo e do comércio, fruto da relativa paz e estabilidade que hoje vivem. A CEEAC parece mais um projecto económico adiado, fruto da permanente convulsão em que vivem alguns dos países que a integram, com especial realce para RDC, persistentemente instável. Uma verdadeira espinha espetada na “garganta” da SADC.