quinta-feira, 28 de maio de 2009

ENERGIA, AMBIENTE E DEMOCRACIA


O Ministro da Energia dos Emiratos Árabes Unidos veio a Luanda pedir o apoio do nosso país na sua pretensão de ver instalada, em Abu Dhabi, a capital dos Emiratos, a sede da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA). A Alemanha, precisamente quem mais se bateu para a criação dessa instituição, e um dos países europeus mais avançados em matéria de energias renováveis, está também interessada em ter a sede dessa Agência no seu território.

A Agência Internacional de Energia Renovável terá como missão proporcionar aconselhamento e apoio no processo de introdução e aceleramento do uso das energias renováveis, seja aos países industrializados, seja aos em vias de desenvolvimento. Ela terá, pois, um carácter essencialmente técnico.

Achei muito interessante a vontade expressa pelo Ministro daquele país asiático, dado que se trata de um gigante na produção mundial de petróleo, muito embora nem todos os territórios integrantes dos Emiratos Árabes Unidos sejam, de per si, grandes produtores de petróleo. Assinalo, a título de exemplo, o Dubai, talvez o caso mais emblemático, dado que conseguiu diversificar a sua economia, ao ponto de o grosso das suas receitas provir já essencialmente do rendimento do sector dos serviços, sejam serviços financeiros ou mesmo do turismo. Infelizmente, este tipo de dependência colocou também o Dubai na encruzilhada da presente crise internacional, com reflexos directos na actual desaceleração do seu espectacular crescimento económico.

É interessante também notar que, sendo embora os Emiratos Árabes Unidos um dos símbolos mundiais da indústria petrolífera, é lá que se situa uma das cidades mais ecológicas do mundo, Masdar, com praticamente zero emissões de carbono.

O momento económico que hoje se vive pode ser caracterizado por alguns traços fundamentais: i) Reordenamento do sistema financeiro internacional; ii) Tentativa de recuperação económica por parte das principais economias do mundo, e também de algumas economias emergentes; iii) Contenção dentro de limites aceitáveis das tentações proteccionistas sempre re-emergentes em situações de crise profunda; iv) Esforços de melhoria da eficiência dos processos industriais, tornando-os menos gastadores e mais competitivos; v) Desenvolvimento de uma nova matriz energética com peso decrescente das fontes não renováveis, como o petróleo e o carvão; vi) Paulatina substituição dessas energias fósseis, por definição muito poluentes, por energias não poluentes.

Dias antes da visita do Ministro dos Emiratos Árabes Unidos, e no âmbito da Semana Global de Educação para Todos, o Ministério da Educação de Angola lançou um programa de formação em energias renováveis, dando assim os primeiros passos para a inclusão desta matéria nos currículos escolares. Na altura, assinalou-se que a abrangência do programa de formação se limitaria ainda aos técnicos do Ministério da Educação, bem como ao corpo directivo de 7 Institutos Médios Agrários.

Foi com imenso agrado que tomei conhecimento do passo dado pelo Ministério da Educação. Tenho consciência de que o futuro económico do nosso país passará cada vez menos pelo desenvolvimento de uma economia muito centrada na exploração petrolífera, e que o futuro do nosso planeta estará muito dependente da qualidade da energia que se irá consumir nos próximos tempos. Quando se fala em energias renováveis, vêm-nos logo à cabeça termos como: energia eólica, energia solar, energia das marés, das ondas, hídrica, geotérmica, da biomassa, biogás, etc. A questão da energia nuclear tem outras implicações, em especial, em termos de segurança das suas instalações.

Os bio-combustíveis são dos temas mais polémicos, sobretudo pela eventual relação que se estabelece com as disponibilidades alimentares, e os prováveis impactos no meio ambiente. A prazo, o seu desenvolvimento pode ampliar a desmatação e consequente desertificação. Acusa-se ainda a energia proveniente da biomassa e o biogás de serem poluentes, e o seu futuro está muito condicionado. Energias limpas serão, seguramente, as mais procuradas, como por exemplo a eólica, hoje com um aproveitamento crescente em países como a Dinamarca, Portugal, Alemanha, Suécia, Áustria, etc.

Nesta busca de fontes alternativas, o gigante norte-americano não está distraído, de tal modo que o novo presidente daquele país, Barack Obama, apresentou há dias uma proposta de transformação da actual matriz energética norte-americana. Obama condiciona o apoio à indústria automóvel ao desenvolvimento de novos modelos de carros, menos gastadores e menos poluentes. Com isso, ele quis dar resposta a pelo menos 4 questões: i) Aumentar a eficácia e a competitividade dessa indústria face à indústria automóvel europeia e, sobretudo, asiática; ii) Estimular a criação dos postos de trabalho de que a economia americana está muito necessitada; iii) Pela redução dos gastos em combustíveis, aumentar as disponibilidades financeiras dos consumidores e o consequente consumo de outros bens e serviços, o que ajudará a debelar a crise; iv) Contribuir para a redução das emissões de gases poluentes, com um claro alívio para o nosso planeta, muito temente de um colapso iminente.

Por altura do seu discurso de tomada de posse, Obama disse que via com enorme preocupação a forte dependência que a economia norte-americana ainda tem de um produto que, em grande parte, é produzido em países onde se instalaram regimes ditatoriais. Esta é, claramente, uma dimensão política do problema da energia, uma dimensão que não pode ser descurada, pois limita o campo de manobra dos países democráticos.

As nossas disponibilidades petrolíferas têm elas também 2 dimensões importantes: i) Por um lado, são fonte de riqueza que gera benefícios económicos globais, mesmo que mal distribuídos; ii) Por outro lado, limitam indirectamente a acção dos sectores democráticos, confrontados que se vêem com os interesses económicos de certos países, teoricamente aliados mas, na realidade, interessados em fazer vista grossa face às limitações que se colocam às verdadeiras transformações democráticas de que necessitamos
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quarta-feira, 20 de maio de 2009

SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE O TARRAFAL

LOCAL: ANTIGO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DO TARRAFAL

 

Com o alto patrocínio do Presidente da República de Cabo Verde e dos Ministérios da Cultura de Cabo Verde, de Angola e Governo de Timor Leste, organizado pelo Fundação Amílcar Cabral e Fundação Mário Soares, contando com o apoio da Fundação Agostinho Neto, Fundação Eduardo dos Santos, Fundação Sagrada Esperança, Liga dos Antigos Combatentes de Angola e CODESRIA, realizou-se entre 28 de Abril e 01 de Maio de 2009, nas antigas instalações do Campo de Concentração do Tarrafal, um Simpósio Internacional sobre o Tarrafal com o objectivo de homenagear todos quantos sofreram neste local as agruras do fascismo e do colonialismo, quando se passam 35 anos do seu encerramento. Para tal, foram convidados os ex-presos sobreviventes e outras personalidades, tendo comparecido em grande número.

 

 

As Palavras de Boas-Vindas foram proferidas pelo Coordenador da Comissão Organizadora do Simpósio, Dr. Álvaro Tavares.

 

 

Na sessão de abertura, ouviram-se intervenções dos Ministros da Cultura de Cabo Verde, Dr. Manuel Veiga, de Angola, Dra. Rosa Cruz e Silva, da Guiné-Bissau, Dr. Aristides Ocante da Silva. De seguida, tomou a palavra o Primeiro-Ministro de Cabo Verde, Dr. José Maria Neves, que também homenageou algumas figuras da Vila do Tarrafal, pelo conforto moral e solidariedade prestados aos presos do Campo de Concentração durante os longos anos de reclusão.

 

 

O Simpósio constou de 4 Painéis Temáticos.

 

O Primeiro Painel, intitulado “A GERAÇÃO DA UTOPIA E O DEVER DE MEMÓRIA” foi iniciado com a intervenção do poeta Mário Fonseca que procedeu ao enquadramento político e ideológico do Movimento de Libertação Nacional nas Colónias Africanas de Portugal, destacando o papel dos seus Pais-Fundadores e primeiros dirigentes.

Aurélio Santos, lutador antifascista português, na altura dirigente da Rádio Portugal Livre, hoje dirigente da URAP (União de Antifascistas Portugueses), foi o orador que se seguiu. O drama dos primeiros presos políticos portugueses enviados para este Campo da Morte Lenta, assim como a adesão do regime de Salazar aos princípios e práticas do Nazismo e do Fascismo foi a substância da sua intervenção. Recordou, porém, também, o modo como os restos mortais daqueles que pereceram no Campo foram recebidos em Portugal, depois da Vitória da Liberdade, com a eclosão do 25 de Abril de 1974.

 

Outro lutador antifascista português, Raimundo Narciso, da Acção Revolucionária Armada (ARA), hoje presidente da Associação-Movimento Cívico “Não Apaguem a Memória”, concentrou-se sobre questões como o heroísmo dos resistentes portugueses e o modo abnegado como enfrentaram o horror do fascismo. Particularizou, porém, as figuras de Edmundo Pedro (hoje com 90 anos de idade) e seu pai, Gabriel Pedro, ambos deportados para o Tarrafal. Fez ainda referência à transformação do antigo Campo de Concentração do Tarrafal em Campo de Trabalho de Chão Bom, por determinação do então Ministro do Ultramar, Adriano Moreira. Lembrou os laços de solidariedade entre os combatentes antifascistas e os lutadores pelas independências das antigas colónias portuguesas.

 

João Pedro Lourenço, Director do Museu da Escravatura de Angola, traçou um roteiro do Movimento de Libertação angolano, referindo, em especial, o papel daqueles que definiram o seu perfil e traçaram os seus caminhos. Aludiu a um certo “discurso revisionista” sobre o significado do Tarrafal daqueles que hoje procuram apresentar uma imagem “adocicada” do Campo de Concentração, adulterando cinicamente o seu significado.

 

Seguiu-se a intervenção do historiador Julião de Sousa, da Guiné-Bissau, com uma retrospectiva do processo de criação do PAIGC, a partir de núcleos clandestinos em Bissau. Recordou o período e a forma de encaminhamento dos presos guineenses para o Campo de Concentração do Tarrafal. Fez uma pequena resenha da vida dos presos da Guiné-Bissau, mostrando a contradição entre a imagem que o regime procurava apresentar ao mundo e o que realmente se passava. Terminou recordando a decisão do então Governador da Guiné de retirar do Campo os prisioneiros da Guiné-Bissau, voltando alguns a ser encarcerados.

 

 

 

Teve também lugar a intervenção da historiadora cabo-verdiana Nélida Brito, concentrando-se no período do Campo de Concentração desde a sua fundação, em 1936, até ao seu primeiro encerramento, em 1954. Deu muito realce às cerimónias fúnebres dos prisioneiros mortos.

 

O historiador português Fernando Rosas fez uma profunda reflexão sobre alguns conceitos e ideias que estruturam os factos históricos da libertação nacional e social, dando-lhe sentido e vida. Não deixou, porém, de recusar pretensões revisionistas que se tentam fazer da história, banalizando e até mesmo desresponsabilizando a ditadura fascista, ao ponto de, inclusive, se consagrar o nome de Salazar numa praça da terra onde nasceu, precisamente na data da comemoração do 25 de Abril deste ano. A resistência esteve sempre presente e activa até 1974. Abordando o tema da hegemonia da memória, em jeito de remate, concluiu: Ninguém é dono da memória. Ninguém tem o direito de se colocar como o seu intérprete exclusivo.

 

Ouviu-se seguidamente o testemunho de um antigo preso do Campo de Concentração do Tarrafal, Carlos Tavares, cabo-verdiano.

 

No período da Tarde, decorreu o Segundo Painel, intitulado “OS IDEIAIS E PRINCÍPIOS”, moderado pelo Presidente da Fundação Amílcar Cabral, Dr. Corsino Fortes.

 

O primeiro orador foi Luzolo Kiala, de Angola, que explanou sobre o tema “Da clandestinidade ao Tarrafal”, traçando o percurso do chamado “Processo dos 50”.

 

Ouviu-se também a comunicação da Professora Aurora Ferreira, numa análise daquilo que denominou “A Recolha de Testemunhos e de Histórias de Vida”.

 

O último orador deste Painel foi o ex-tarrafalista Justino Pinto de Andrade, com uma exposição e análise ao percurso dos angolanos, destacando as diversas faixas etárias a que pertenciam, os sucessivos grupos de chegada, filiações político-partidárias no momento da entrada, libertações, geografia sócio-cultural das prisões, também uma análise por profissões. Terminou recordando o momento da libertação dos últimos presos angolanos, saídos simultaneamente com os últimos presos políticos cabo-verdianos.

 

 

Neste Painel, ouviram-se os testemunhos dos ex-presos Luís Fonseca e Jaime Schofied, de Cabo Verde, Karamó Sanhá e Mário Soares, da Guiné-Bissau.

 

O Terceiro Painel, no período da Manhã do dia 30 de Abril, denominado CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS, foi moderado pelo Ministro da Cultura da Guiné-Bissau.

 

O Embaixador Onésimo Silveira começou por lembrar o seu relacionamento pessoal com alguns dos presos angolanos do Tarrafal e suas famílias. Falou, depois, da problemática dos direitos humanos, integrando-a na luta dos povos pela sua emancipação. Antes, porém, fez uma incursão teórica nos desenvolvimentos do Estado de Direito.

 

O jurista angolano João Pinto traçou a dimensão poética de Agostinho Neto e o seu impulso à Luta de Libertação Nacional.

 

O sociólogo Carlos Cardoso trouxe ao Simpósio uma mensagem de solidariedade e apoio do CODESRIA, que representou.

 

O sociólogo Victor Kajibanga analisou o facto de os Movimentos de Libertação terem descurado a questão da democracia e os direitos humanos. Esboçou um perfil dos Estados e das classes dirigentes africanas no período pós-independência.

 

O também sociólogo Paulo de Carvalho interveio para falar sobre “Cidadania e Direitos Humanos na Angola Contemporânea”, descrevendo a evolução política desde a independência e o modo como se foram produzindo alterações no que respeita aos direitos humanos.

 

Domingos Abrantes, resistente português, lançou um olhar sobre o passado e a luta dos resistentes comunistas portugueses, destacando o papel daqueles que foram deportados para o Tarrafal.

 

Dany Landim, professora de história, cabo-verdiana, fez uma resenha histórica do Campo e insistiu na necessidade de serem reforçados os conteúdos históricos sobre a resistência e a luta de libertação.

 

A historiadora portuguesa, Irene Pimentel, estabeleceu a relação entre a memória e a história. Recordou a necessidade de se distinguir um “Campo de Concentração” de um “Campo de Extermínio” e procedeu à caracterização do Campo de Concentração do Tarrafal.

 

Ouviram-se testemunhos de Edmundo Pedro, de Portugal, Fernando Tavares, Eulália Freire (Nha Beba), e Pedro Martins, de Cabo Verde, bem como Manuel Pedro Pacavira, de Angola

 

“QUE FUTURO PARA O CAMPO DO TARRAFAL?” foi o quadro em que se inseriu o Quarto Painel, no período da Tarde, com 4 intervenções: José Vicente Lopes, de Cabo Verde, apresentou a sua “Recolha de Testemunhos”; Antoninho Baptista, de Timor-Leste, falou sobre o “Arquivo & Museu da Resistência Timorense”; Alfredo Caldeira, de Portugal, desenvolveu a questão do “Dever de Memória” e do direito à memória, sublinhando que memória sem liberdade e democracia é tão só propaganda; Carlos Carvalho, Presidente do Instituto de Investigação e Património Cultural de Cabo Verde, apresentou o “Projecto do Ministério da Cultura de Cabo Verde sobre o Campo de Concentração do Tarrafal”. Este Painel foi moderado pelo Ministro da Cultura de Cabo Verde.

 

 

O último dia do Simpósio constou da sessão de encerramento, que foi presidida por Sua Excelência o Presidente da República de Cabo Verde, Pedro Pires, e teve também a honrosa presença de Sua Excelência o Dr. Mário Soares, ex-Presidente da República de Portugal, que dedicaram aos presentes palavras de agradecimento e regozijo pela forma como decorreram os trabalhos, estimulando à consecução dos objectivos pretendidos.

 

A Análise Geral do Simpósio permitiu extrair as seguintes Recomendações:

 

·     Destapar e colocar em espaço de memória os outros “Tarrafais” espalhados pelo mundo, e em particular nos países integrantes da CPLP, tais como Ilha das Galinhas, na Guiné-Bissau, Campos de S. Nicolau, Missonbo e Colónia Penal do Bié, em Angola, Machava, em Moçambique, Vikeke e Ataúro, em Timor-Leste, e Tarrafal de S. Nicolau, em Cabo Verde;

 

·     Manifestar o seu repúdio pela crescente utilização de campos de concentração e de tortura em conflitos recentes;

 

·     Legislação apropriada e multinacional (Portugal, Angola, Cabo Verde e Guiné-Bissau) para garantir o carácter perene da importância do Campo de Concentração do Tarrafal, para que o seu destino não dependa das vicissitudes e vontades circunstanciais dos respectivos governos;

 

·     Assegurar a integridade das instalações de Campo, tal como se encontravam no momento da sua libertação;

 

·     Que o Campo se torne um espaço de memória de todos aqueles que aqui sofreram, fazendo dele um espaço memorial da conquista da Liberdade;

 

·     Que seja criado, dentro do Campo de Concentração do Tarrafal, um Museu da Resistência e da Liberdade;

 

·     Que se crie dentro do Campo um Centro Internacional de pesquisa da Luta pelas Independências;

 

·     Criar no espaço envolvente do Campo, áreas dedicadas às Crianças e à Juventude para que elas possam apreender melhor a História;

 

·     Criar nos terrenos adjacentes ao Campo valências capazes de assegurar a sustentabilidade do Campo;

 

·     Inserir nos compêndios escolares mais matérias sobre a História e as Lutas de Libertação Nacional dos nossos países;

 

·     O Simpósio apela aos governos de Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau e Portugal para que assegurem os encargos de edificação e manutenção do Campo de Concentração do Tarrafal como Memorial da Luta comum dos nossos povos.

 

 

 

Tarrafal, a 01 de Maio de 2009

 

 

 

Os Participantes

O RELATÓRIO DA OCDE

  1. O recentemente publicado relatório anual da Organização para o Desenvolvimento e Cooperação Económica (OCDE), denominado “African Economic Outlook”, apresenta uma perspectiva bastante pessimista para o desempenho da generalidade das economias africanas. Ao contrário dos mais de 5% de crescimento que a África registou em 2008, para o ano em curso, o relatório da OCDE aponta para apenas cerca de metade desse valor, 2,8%, assacando o principal da responsabilidade, sobretudo, à queda dos preços das nossas matérias-primas, bem como à diminuição da procura por parte das economias desenvolvidas.

 

  1.  Quanto a Angola, o relatório da OCDE é mesmo demolidor, pois diz que a nossa economia será das mais afectadas pela actual crise mundial, prognosticando uma contracção de 23%, em termos nominais, se comparado com o PIB atingido em 2008. Quer dizer que tal contracção engolirá totalmente os 15,8% de crescimento conseguido no ano de 2008, retirando também 7,2 pontos percentuais ao valor do ano de 2007. Como a OCDE justifica, então, o anunciado descalabro: i) Pela redução dos preços internacionais do petróleo; ii) Pela diminuição da nossa quota de produção petrolífera, fruto dos compromissos assumidos no quadro da OPEP. Ainda assim, o relatório admite um mitigado crescimento na nossa economia não-petrolífera, porém, insuficiente para alavancar o PIB do ano em curso.

 

  1. Por altura da divulgação de relatórios internacionais, sejam eles de carácter económico, político ou social, geralmente soam certas sirenes, perfilando-se de seguida em verdadeira “prontidão combativa” os mais indefectíveis arautos do regime. Para esses “apologetas”, um relatório que não teça encómios à sua dama, é a encarnação do inimigo, por isso, desembaiam as espadas, passando a verberar contra a credibilidade e a seriedade das organizações internacionais. Chegam a acusá-las de estarem ao serviço de interesses inconfessos... Por enquanto, nota-se alguma contenção, embora já se vá pondo em causa a grandeza da dita contracção, o que não é o mais importante no debate que se vai travando.

 

  1. É verdade que, nos últimos cinco anos, o nosso PIB cresceu, em média, 18% ao ano, fazendo da nossa economia uma das mais dinâmicas do mundo, um vigor que se deveu ao concurso repartido dos sectores mineral e não-mineral, este último muito impulsionado pelas receitas fiscais geradas pelo primeiro.

 

  1. A recente redução das receitas petrolíferas limitou drasticamente o financiamento interno da economia, ao ponto de o Governo se ver já obrigado a reconhecer o impacto da crise mundial. Em consequência, prometeu o reequacionamento e a re-calendarização do seu plano de investimentos públicos, um decisão que produzirá impactos sobre o sector não-petrolífero, muito dependente do investimento público, mas, igualmente, do consumo público.

 

  1. A previsão feita pelos peritos da OCDE contraria, e de que maneira, as repetidas afirmações feitas por alguns dos responsáveis máximos da nossa economia, designadamente o actual Ministro da Economia, Manuel Nunes Júnior, para quem, no presente ano, teremos uma taxa de crescimento do PIB não inferior a 3%, esta que é a taxa média de crescimento da nossa população. O Ministro Manuel Nunes Júnior repetiu a sua fé quando dissertava, em Luanda, numa Conferência com o tema “Crise no mundo e em Angola, o que é, onde está, quanto custa e como resolver”. É verdade que o Ministro da Economia admitiu um abrandamento no ritmo de crescimento da economia, mas descartou a possibilidade de haver recessão.

 

Nota: (Tecnicamente, há recessão quando a economia de um país tem um crescimento negativo durante dois trimestres seguidos. Esta é uma terminologia técnica que pode, porém, esconder alguma inverdade, pois um país pode ter a sua economia a não crescer nos dois primeiros trimestres e nos seguintes crescer até mais vigorosamente nos anteriores. Do ponto de vista global, ela cresceu. Será, portanto, incorrecto, considerar que, tecnicamente, a economia esteve em recessão durante o ano).

 

  1. A previsão da OCDE foi apenas a última, já que, desde meados do ano passado, se vêm escutando outras opiniões não muito animadoras quanto ao desempenho da nossa economia para os próximos tempos. Recordo que ainda corria o mês de Junho de 2008, quando, no relatório anual sobre o “Desenvolvimento Global”, apresentado na Cidade do Cabo, o Banco Mundial apontava para uma desaceleração do ritmo de crescimento da economia, dizendo, por exemplo, que ela não iria crescer os 25,4% inicialmente apontados para o ano de 2008. Veio, depois, a constatar-se um crescimento na ordem dos 15,8%. Para o ano de 2009, o Banco Mundial previa ainda um crescimento de 10,2%, que é o dobro da percentagem prevista pela OCDE, 5,1%.

 

  1. A sustentabilidade de um crescimento próximo dos 20% ao ano foi então posto em causa por Hans Timmer, um alto funcionário do Banco Mundial. Hans Timmer declarou mesmo que, no longo prazo, Angola possuía um potencial de crescimento entre os 6% e os 7%, devido, sobretudo, ao desempenho dos outros sectores económicos que estão a ser impulsionados pelas receitas petrolíferas. Para ele, o crescimento do sector petrolífero tinha, pois, claras e óbvias limitações.

 

  1. No início de Março deste ano, em relatório, o Banco Português de Investimento (BPI) contrariou as previsões bastantes optimistas das autoridades económicas angolanas que haviam inserido no Orçamento aprovado pela Assembleia Nacional uma taxa de crescimento do PIB de 11,8%. Pela primeira vez, o BPI falou numa retracção da nossa economia, na ordem dos 3%, fruto do que denominou de “o arrefecimento global”, mesmo que haja “pouca expressão do mercado financeiro, reduzida exposição financeira ao exterior e reduzidas necessidades de financiamento”.

 

  1. Porém, em Janeiro, Ricardo Gazel, economista-chefe do Banco Mundial em Angola, dissera já que o ano de 2009 seria “extremamente difícil”, por causa da forte dependência da nossa economia face às receitas petrolíferas.

 

  1.  Em reacção, o Professor Alves da Rocha discordou dizendo que, aquando da elaboração do Orçamento para 2009, já se havia tido em devida conta uma redução da participação do petróleo na formação do PIB, de 55% para 35%. Declarou, por isso, que as previsões do economista-chefe do Banco Mundial em Angola eram “previsões dramáticas que até podem afastar o investimento estrangeiro”. Admitiu ainda que Angola tem margem de manobra para um comportamento razoável perante a crise. Antes, porém, de recomendar ao Governo uma maior atenção, disse: “Não se está perante um crescimento negativo, mas, sim, perante um crescimento de baixa intensidade”. Em substância, a fé do Professor Alves da Rocha coincide com a do Ministro Manuel Nunes Júnior, também com a do Ministro das Finanças, Severim de Morais, e de outras autoridades da área política e económica, além de alguns analistas. Na altura do pronunciamento público de Ricardo Gazel, eu secundei a sua posição. Admiti mesmo a possibilidade de um crescimento negativo, e expliquei porquê.

 

  1. Muito sinceramente, por tudo aquilo que hoje se vê – alguma desorientação na definição das políticas face à crise – eu gostaria que o meu amigo e colega Alves da Rocha, assim como o Ministro da Economia e o Ministro das Finanças tivessem razão. Mas creio que não terão, pois são passados já cinco meses no ano de 2009, e a crise mundial aprofunda-se a cada dia que passa!

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Como falamos a democracia?

Os nacionalistas africanos não ficaram à espera que um vocabulário apropriado nascesse nas línguas maternas dos seus países.

Mia Couto *

Na bela cidade de Durban, falávamos eu e outros escritores africanos da surpresa do modo como, no Zimbabwe, tantos ainda apoiam Robert Mugabe. Havia, no grupo, escritores de vários países de África. Aproveitámos o que melhor há nas conferências literárias: os intervalos. A nossa perplexidade não se limitava ao caso zimbabweano. Como é que povos inteiros, em outras nações, se acomodaram perante dirigentes corruptos e venais. De onde nasce tanta resignação? 
Uma das razões dessa aceitação reside na forma como as línguas se relacionam com conceitos políticos da modernidade. Por exemplo, um zimbabweano rural designa os seus líderes nacionais como entidades divinizadas, fora das contingências da História e longe da vontade dos súbditos. O mesmo se passa em quase todas as línguas bantus. 
A questão pode ser assim formulada: como pensar a democracia numa língua em que não existe a palavra «democracia»? Num idioma em que «Presidente» se diz «Deus»? Nas línguas do Sul de Moçambique, o termo para designar o chefe de Estado é «hossi». Essa mesma palavra designa também as entidades divinas na forma dos espíritos dos antepassados, traduzindo uma sociedade em que não há separação da esfera religiosa. 
Parece uma questão de ordem linguística. Não é. Trata-se do modo como se organizam as percepções e as representações que uma sociedade constrói sobre si mesma. A sacralização do poder não pode casar com regimes em que se supõe que os líderes são escolhidos por livre votação. Numa sociedade em que os súbditos se convertem em cidadãos. 
Esse assunto escapa muitas vezes a quem se especializou em organizar seminários sobre cidadania e modernidade em África. A problemática política é vista, quase sempre, na sua dimensão institucional, exterior à intimidade dos cidadãos. Quando o participante do seminário explicar à sua comunidade o conteúdo dos debates usará a sua língua materna. E sempre que se referir ao Presidente ele fará uso do termo «deus». Como pedir uma atitude de mudança nestas circunstâncias? 
O que se pode fazer? Será que os falantes destas línguas estão condenados à imobilidade por causa desta inércia linguística? Na realidade, existem tensões entre a lógica interna de algumas destas línguas e a dinâmica social. Estas tensões não são novas e sempre foram resolvidas a favor da adaptação criativa e da criação de futuro. 
Já no passado, as culturas africanas (e todas as outras em todos os continentes) tiveram que se moldar e se reajustar perante aquilo que surgia como novidade. Eu mesmo testemunhei o modo veloz como as línguas moçambicanas se municiaram de instrumentos novos, roubando e apropriando-se de termos não próprios. 
Com o uso generalizado esses termos acabaram indigenizando-se. Sem drama linguístico, sem apoio de academias nem de acordos ortográficos os falantes dessas línguas «pediram» de empréstimo palavras de outros idiomas. Moçambique é, nesse domínio, um caldeirão dessas mestiçagens. 
Os nacionalistas africanos não ficaram à espera que um vocabulário apropriado nascesse nas línguas maternas dos seus países. Eles começaram a luta e essa mesma dinâmica contaminou (mesmo com uso de termos e discursos inteiros em português) as restantes línguas locais. 
Tudo isto nos traz a convicção do seguinte: a capacidade de questionar o presente necessita de língua portadora de futuro. A necessidade de sermos do nosso tempo e do nosso mundo exige línguas abertas ao cosmopolitismo. África – tantas vezes pensada como morando no passado – já está vivendo no futuro no que respeita à condição linguística: quase todos africanos são multilingues. 
Essa disponibilidade é uma marca de modernidade vital. O destino da nossa espécie é que cada pessoa seja a humanidade toda inteira.

Crónica de Mia Couto, escritor moçambicano, publicada na edição de Abril da revista África 21

segunda-feira, 11 de maio de 2009

DUAS DISPOSIÇÕES ALGO POLÉMICAS

  1. No texto do seu projecto constitucional, a UNITA inseriu algumas questões que acho de grande relevância, quando se inicia o debate para a elaboração da futura Constituição. Porém, tratarei agora apenas de duas: a problemática da nacionalidade e cidadania angolanas, e o chamado direito de resistência, matérias que, por si só, podem ser capazes de criar linhas de fractura político-ideológica, animando, então, o debate constitucional.

 

  1. A UNITA classificou os angolanos em dois grupos, uns que definiu como sendo os “angolanos natos”, e integrando no outro grupo os “angolanos naturalizados”. Para mim, uma designação mais adequada para os “angolanos natos” seria a de “angolanos originários”, por contraposição aos “angolanos naturalizados”, uma vez que estes últimos serão aqueles cidadãos estrangeiros a quem é, entretanto, atribuída cidadania angolana, desde que cumpridos alguns requisitos.

 

  1. Teoricamente, a nacionalidade é uma relação jurídica de direito público interno, competindo, por isso, ao Estado definir, e de maneira exclusiva, a quem atribuí-la e de quem retirá-la. Pode-se também ter acesso a uma determinada nacionalidade por via do direito internacional, caso o Estado aceite submeter-se a esse direito.

 

  1. Uma pessoa natural pode adquirir uma nacionalidade por duas vias: por aquisição originária – ou seja, no momento do nascimento – ou posteriormente, por naturalização. Existem também dois caminhos para a aquisição da nacionalidade originária: o ius sanguinis, ou seja, o “direito de sangue”, também chamada nacionalidade por filiação, e o ius soli, o “direito de solo”, que é a nacionalidade pelo território onde o indivíduo nasceu. O direito positivo angolano optou claramente pelo ius sanguinis, na sua vertente ambilinear, por filiação que pode provir do pai ou da mãe. É essa a definição constante do projecto constitucional angolano da UNITA. Suspeito que, pelo menos nesse domínio, não haverá muitas diferenças relativamente às restantes propostas que darão entrada na Comissão Constitucional, mesmo que se venham a detectar pequenas divergências de pormenor.

 

  1. A opção pelo ius sanguinis ou pelo ius soli tem muito a ver com a tradição do país concreto, ou com aquilo que se pretende que o país venha a ser. Se um país é de tradição imigratória, como, por exemplo, os Estados Unidos da América, Brasil, Argentina, Austrália, o direito de nacionalidade tem por base o ius soli, o local de nascimento da criança. Os países europeus são mais de tradição emigratória, pelo que optam pelo ius sanguinis. A Angola de hoje tende claramente para um modelo próximo do europeu, alegadamente para salvaguardar direitos e elementos identitários.

 

  1. Vejo, porém, com certa relutância, a obrigação apresentada pela UNITA para alguém obter a naturalização angolana ao ter que “demonstrar possuir vínculos identitários da história, cultura, línguas e costumes da cidadania angolana…”. Posto nestes termos, torna-se tudo muito subjectivo, isto porque, por exemplo, não vejo que haja um único padrão cultural em Angola. Nós somos um país onde coexistem múltiplas culturas, muitas das quais chegam a colidir frontalmente com o direito positivo vigente. Recordo, por exemplo, a prática de se eliminar com certa dose de arbitrariedade pessoas idosas acusadas de serem feiticeiras, como aconteceu não há muito tempo no Kuando Kubango. Tenho também bem presente a ostracisação e mesmo a eliminação física de crianças também acusadas de feiticeiras. Outros exemplos: o casamento tradicional que envolve a matança de bois ou carneiros não é um padrão cultural nacional, mas, sim, exclusivo de algumas comunidades rurais, ou então de recente ancestralidade rural; a família extensa tende a diminuir com o fenómeno da urbanização galopante; a prática de o irmão mais velho ficar com a viúva, não é um padrão cultural angolano, mas apenas de algumas comunidades; espoliar a viúva de todo o património do casal, depois da morte do cônjuge, tem também um âmbito restrito do ponto de vista geográfico e não é comum, por exemplo, nas chamadas classes médias urbanizadas de longa data. Temos múltiplas línguas e costumes, e o seu uso prática tem muito a ver com a origem e a inserção social de cada um. Recordo que o Português também é uma língua nacional, e é a primeira e única língua para muitos angolanos. Ela tem a mesma dignidade das outras línguas, e a sua expansão pelas diversas comunidades é uma exigência do desenvolvimento, do acesso ao saber e da modernidade.

 

  1. Respeitando a exigência temporal da residência e mais um ou outro predicado, o candidato a nacional angolano por via da naturalização deveria sujeitar-se ao preceito de um conhecimento médio de uma qualquer das línguas de Angola (incluindo o Português), e mais alguns dados sobre a nossa história recente. Tudo o resto é demasiado vago, subjectivo e está muito dependente das mutações do tempo e da dinâmica social.

 

  1. A atribuição da nacionalidade tem pelo menos duas valências que devem ser tidas em conta: por um lado, confere ao adquirente determinados direitos, mas, igualmente, deveres e obrigações; por outro, aumenta o nosso potencial enquanto país. Ela poderá ser, pois, também, do nosso próprio interesse.

 

  1. Julgo que a questão da dupla nacionalidade é a mais polémica. A condição de “cidadão angolano originário” não deve ser passível de qualquer beliscadura nos seus direitos, isto porque ela pode ser adquirida por sangue, por casamento, e até mesmo pelo tempo de permanência num país estrangeiro. De modo algum se pode ver essa condição como configurando um crime, um quase crime, ou algo capaz de provocar uma lesão no nosso interesse nacional. Não se trata de gente portadora de um qualquer defeito ou estigma. São “angolanos originários” de pleno direito e não devem ser equiparados aos “angolanos naturalizados”. O controlo dos seus actos deve ser realizado pelos mecanismos políticos, jurídicos e outros que o Estado detém para preservar o seu interesse. São esses mecanismos que dão pujança e maturidade ao Estado.

 

  1. Por fim, abordemos a polémica proposta de inserção no projecto constitucional da UNITA do instituto do direito de resistência, algo que terá provocado alguma perturbação psicológica, sobretudo porque a UNITA cuidou de introduziu na sua redacção do artigo 23º a expressão “repelir pela força qualquer agressão”, quando diz: “Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública ou quando a autoridade pública viole os direitos fundamentais e ordem constitucional democrática.”

 

  1.  O direito de resistência é um instituto político-jurídico posto ao serviço do cidadão permitindo-lhe enfrentar o Estado, quando este não concretiza as disposições constitucionais, em especial, quando viola (ou descura flagrantemente) direitos fundamentais do cidadão, como o direito à habitação, saúde, educação, segurança, etc. São esses e outros direitos que garantem a própria sobrevivência do cidadão. São também eles que constituem a razão da existência do Estado, enquanto uma entidade promotora do bem comum.

 

  1.  É consensual a ideia segundo a qual a convivência social provoca, necessariamente, uma redução da nossa liberdade individual. É esta constatação que legitima o poder, dando-lhe capacidade para cercear algumas das nossas liberdades. Mas os limites à nossa liberdade são definidos por leis democráticas e não por uma qualquer arbitrariedade pessoal ou de grupo.

 

  1.  O direito de resistência vem consagrado nos textos constitucionais de muitos países democráticos, quer seja de uma forma explícita ou implícita. Ele manifesta-se de forma implícita através de vários meios legais, somo sejam o direito de petição, manifestação, habeas corpus, o direito à greve, a objecção de consciência religiosa. O direito de resistência passa a ter uma expressão mais extrema na actividade de determinados movimentos sociais, e, sobretudo, na revolução e na guerra. Ao exercício do direito de resistência que se devem as diversas lutas contra a opressão e as desigualdades. O direito de resistência tem sido o grande motor das transformações sociais.

 

  1.  A quem queira questionar o direito de resistência, imponho, pois, algumas perguntas: Será lícito ficar-se indiferente quando um poder exorbita as suas funções constitucionais, quando se torna despótico, ou quando se alheia do bem comum que tem o dever de promover e realizar? Será também lícito um poder descurar os fins democráticos e de justiça social para o qual foi instituído? São, afinal, questões prévias a uma qualquer discussão sobre o formato do texto, embora eu reconheça a preocupação que causou a inserção no artigo 23º do projecto constitucional da UNITA da inquietante expressão “repelir pela força”.