quarta-feira, 15 de julho de 2009

MORREU UM ÍCONE: MICHAEL JACKSON


Quem tem mais que 50 anos de idade, certamente guarda na memória a imagem dos cinco irmãos norte-americanos, negros, ainda crianças, mas que já maravilhavam o mundo com as suas interpretações musicais. Decorria a segunda metade da década de 1960. Depois, foram crescendo e aumentando ainda mais o número dos seus admiradores, entre os quais eu.

Tive, pois, a possibilidade de acompanhar o início da carreira dos irmãos Jackson: Tito, Jermaine, Marlon, Jackie e, naturalmente, Michael, o mais novo dos cinco, seguramente, o mais talentoso. Todos usavam penteado no estilo afro. Tinham tez escura, não havendo qualquer confusão quanto à sua raça. O seu grupo musical, os “Jackson Five”, foi lançado pela gravadora Motown Records, com sede em Detroit, ela que se tornou também responsável pela mediatização de grande parte dos artistas negros do “soul” norte-americano. Soube depois que o pequeno Michael Jackson enveredara por uma trajectória a solo, apoiado ainda pela Motown Records.

Em 1984, em Paris, apercebi-me do enorme prestígio de Michael Jackson, ao ver nos Campos Elísios – a enorme e emblemática avenida parisiense – grupos de jovens, geralmente negros, exibirem os seus dotes, imitando os passos de dança criados por Michael Jackson e exibidos à exaustão no seu famoso álbum Thriller, de 1982. Este álbum é ainda hoje considerado o mais vendido de todos os tempos, com uma produção que se diz acima dos 120 milhões de exemplares.

Não acredito que haja alguém que tenha ficado indiferente à magia contagiante da sua coreografia. Eu já não tinha idade, nem postura, para andar a retorcer-me na rua, mas seentia a carga emotiva que Michael Jackson produzia sobre os jovens de então. Tornei-me seu fã, embora tivesse uma enorme admiração por Lionel Richie ou mesmo o britânico Billy Ocean, menos espectaculares mas, para mim, mais evoluídos musicalmente. Pelo menos, era assim que eu pensava.

Thriller ficou gravado na história fonográfica como um importante marco no processo de democratização e de luta contra a discriminação racial do espaço musical norte-americano. Com essa maravilha que se chama “Billie Jean”, Michael Jackson tornou-se uma referência na MTV. As técnicas de dança criadas por Michael Jackson, “robot” e “moonwalk” ultrapassaram todas as fronteiras e são a sua imagem de marca. “Moonwalk” faz lembrar as excentricidades de Fred Astaire, o indiscutível mago da dança.

Michael Jackson deixa uma herança musical que permanecerá para sempre, tal como Elvis Presley. Ao todo, os seus álbuns venderam acima de 750 milhões de cópias, e agora que nos resta apenas a sua memória, seguramente ultrapassará todos os recordes de vendas póstumas. Mas, Michael não foi apenas felicidade. Michael viveu episódios tristes, teve uma vida demasiado complicada para uma só pessoa e ainda por cima frágil como era… Por exemplo, uma doença de pele transformou-o ironicamente no “negro mais branco do mundo” – como se foi dizendo. O vitiligo, doença que retira o pigmento da pele, descaracterizou-o, tornando-o alvo de chacota.

Foi sempre muito fácil acusar Michael Jackson de querer intencionalmente embranquecer a pele para esconder a sua condição de negro. Eu penso que os seus detractores tinham uma intenção bem clara: subtilmente, passar a ideia de que o negro, quando famoso, deseja a todo o custo ser branco, para assim completar o ramalhete… Até as operações que fez ao nariz foram sistematicamente apresentadas dentro do mesmo objectivo: ser branco, mesmo que fosse apenas na aparência... Sabe-se, porém, que foi durante um ensaio que Michael Jackson caiu e quebrou o nariz. A primeira operação cirúrgica criou-lhe complicações respiratórias que o forçaram a mais uma ou duas novas intervenções cirúrgicas. E assim ele foi ficando com aquele aspecto atípico, quase de uma múmia egípcia ressuscitada… O seu couro cabeludo foi também queimado por fogo de artifício, durante a gravação de um comercial para a televisão, com propaganda para a Pepsi Cola. Há imagens desse momento dramático. Mas não importa: neste nosso mundo o que é mau espalha-se de forma célere, sobretudo, quando alguém é famoso… Muita gente soube de tudo isso. Porém, era mais fácil e atractivo destratá-lo, acusá-lo das mais mesquinhas e humilhantes tentações. É essa a tendência dos que não sabem conviver bem com o êxito, sobretudo, quando os vencedores são estranhos ao seu meio…

Michael Jackson não foi apenas cantor, compositor e dançarino, ele foi também um grande amante de causas de beneficência, apoiou várias obras de caridade. Recordo, por exemplo, o seu empenho, juntamente com outros artistas, na criação e comercialização de uma música para ajuda às crianças desvalidas em África, em especial na Etiópia. Michael Jackson escreveu a letra e Lionel Richie musicou-a ao piano. Quem não se lembra da célebre canção que ainda hoje se canta, “We are de World” – uma singela manifestação de solidariedade para com os pobres do nosso continente!!!

É verdade que Michael teve uma vida plena de sucessos. Mas, não lhe faltaram situações menos boas. Por exemplo, a acusação – nunca comprovada em tribunal – de abuso sexual de menor. Também os seus casamentos falhados. Seja como for, Michael Jackson foi genial, solidário e controverso. Para todo o sempre, foi o “Rei da Música Pop”. A minha geração e a dos mais velhos que eu tivemos também o Elvis Presley, o “Rei do Rock”. Ambos morreram relativamente novos, quando ainda podiam continuar a espalhar o seu talento.

Na arte – o espaço privilegiado dos que são extraordinariamente dotados – ter-se um Rei de modo algum é antidemocrático. Aí, Rei é aquele a quem se reconhece o mérito de ter contribuído mais do que os outros para que o nosso mundo seja um recanto bonito e harmonioso. Agora, o trono está vago e os nossos corações estão profundamente feridos!

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