quarta-feira, 7 de abril de 2010

FINALMENTE, A TAAG SAÍU DO BURACO…

1. A 4 de Julho de 2007, a nossa companhia aérea de bandeira, a TAAG, foi inserida na “lista negra” da União Europeia, juntamente com cerca de 100 outras companhias aéreas, por sugestão do seu Comité de Segurança Aérea. A decisão foi tomada por unanimidade. Foram ainda objecto da mesma medida companhias aéreas de países como a Rússia, Bulgária, Moldávia, Indonésia, Paquistão, Irão, uma “mão cheia” de antigas Repúblicas Soviéticas, e inúmeros países africanos como, por exemplo, RDC, Suazilândia, Serra Leoa, Libéria, etc. O impedimento da TAAG veio na sequência de uma denúncia das autoridades aeronáuticas francesas que constataram “sérias deficiências” nas aeronaves utilizadas pela TAAG, tendo comunicado o facto a quem de direito na União Europeia.

2. A decisão da União Europeia foi anunciada poucas horas antes de um Boeing 737 da nossa companhia aérea, partido de Luanda, ter feito uma aterragem de emergência em Mbanza Congo e depois embatido numa residência, que ficou completamente destruída. O saldo deste incidente foi de seis mortos e um número significativo de feridos. Mais ou menos, na mesma ocasião, outra aeronave angolana foi protagonista de um episódio rocambolesco, ao aterrar, por engano, num aeroporto militar da Zâmbia, quase criando um incidente diplomático entre os dois países.

3. A medida de suspensão aplicada à TAAG comoveu a nossa opinião pública, tendo também levantado uma enorme polémica, sobretudo, quando se procurou decifrar as reais causas de tão drástica decisão. Recordo-me perfeitamente de algumas das posições tomadas publicamente por certos responsáveis angolanos, ao acusarem as autoridades europeias de ciúme pelo facto de Angola estar a ampliar a sua frota aérea com a aquisição de aviões de proveniência norte-americana. Para esses responsáveis, tudo, afinal, não passava de uma cabala. Para eles, Angola cumpria, quase na íntegra, os requisitos exigidos para poder voar na Europa.

4. É evidente que tais alegações não convenceram a maioria dos nossos concidadãos, em especial os mais avisados, já porque, internamente, era mais do que clara a incapacidade da nossa companhia para cumprir eficazmente as suas obrigações. Aqueles responsáveis que, então, e em desespero de causa, apelaram à retaliação, caíram no ridículo, desacreditando-se. Recordo ainda a ingrata tarefa que coube à porta-voz da TAAG, a Dr.ª Agnela Barros, tentando negar, ou reduzir o nosso grau de responsabilidade no imbróglio.

5. Faço, porém, justiça ao modo sereno e autocrítico como técnicos há muito ligados à nossa aviação civil reagiram à proibição europeia, aconselhando à necessidade de tomarmos consciência sobre as nossas debilidades, bem como ao aproveitamento da desagradável ocasião para as superar. Fazendo-o – disseram eles – passaríamos de uma companhia aérea proscrita para a condição de uma companhia aérea respeitada e competitiva. Foram autores destes pronunciamentos apaziguadores, por exemplo, os comandantes José Luís Prata e Rui Carreira. A sua perspicácia e capacidade de autocrítica terão, seguramente, contribuído muito para a postura que veio então a ser adoptada pelas autoridades máximas do nosso país.

6. As primeiras inconformidades que vieram a público diziam respeito aos manuais das aeronaves. Depois, passou a falar-se também da qualidade técnica de algumas das nossas tripulações, assim como de certos equipamentos de bordo capazes de favorecer uma maior segurança aérea. Enfim, tudo somado mostrava que não reuníamos as condições médias de segurança para operar nas linhas aéreas europeias.

7. Os que pretenderam “tapar o sol com a peneira”, isto é, aqueles que pretenderam esconder ou minorar as nossas debilidades, chegaram ao ponto de, na altura, propor aquilo que apelidei de “a pior solução”. Para eles, deveríamos, sim, optar por voar apenas para os espaços aéreos menos exigentes, nalguns casos, para países periféricos da política e da economia mundial.

8. Vemos agora que os apologistas da “fuga em frente” estavam redondamente enganados. Os seus conselhos, a serem seguidos, remeter-nos-iam para a condição de eternos párias da aviação civil internacional, aprofundando, em consequência, a nossa condição de país subdesenvolvido. Felizmente, venceu o bom senso. Por isso, somos agora capazes de comemorar a nossa readmissão no leque das companhias aéreas respeitadas a nível mundial.

9. Para os entendidos na matéria, a segurança aérea envolve pelo menos cinco dimensões: a qualidade da aeronave, a qualidade do pessoal (pilotos, comissários de bordo, mecânicos, mas, igualmente, os despachantes), mas também as infra-estruturas aeroportuárias, a organização e gestão empresarial, bem como a navegação aérea, o que significa o controlo do tráfego aéreo, as cartas aeronáuticas, as comunicações, etc. Foram estas as dimensões que, afinal, foram sucessiva e exaustivamente escrutinadas pelos fiscais do Comité de Segurança Aérea da União Europeia. Esse repetido escrutínio terá, pela certa, criado muitos amargos de boca quer à Comissão de Reestruturação, quer à Comissão de Gestão da TAAG.

10. Estou em crer que os responsáveis desses dois organismos tiveram que tomar decisões desagradáveis para certos dos seus funcionários. Mas, agora, concluído o processo, vemos que valeu a pena todo o sacrifício, pois os ganhos globais nacionais são muito superiores aos eventuais custos humanos individuais (económicos e até mesmo emocionais), em que se teve que incorrer.

11. Afinal, a segurança aérea não é um mero capricho de certas pessoas. A segurança aérea é mesmo um imperativo de consciência e a base fundamental para o estabelecimento de uma relação de confiança entre nós, enquanto utentes, e a nossa companhia aérea, enquanto prestadora de um serviço que é cada vez mais requerido pelo comum dos cidadãos. O risco é inevitável em qualquer tipo de transportação, mas ele pode ser reduzido, se tivermos tomadas todas as medidas cautelares.

12. Depois de todo o drama que envolveu a nossa companhia de bandeira, a TAAG, penso que é justo levantarmos uma taça de champanhe, em saudação a todos quantos tiveram sobre os seus ombros a responsabilidade de corrigir as múltiplas inconformidades constatadas. Conseguiram, assim, também, restabelecer um pouco do nosso orgulho que ia escorrendo para o esgoto. Esses quadros foram serenos, persistentes e competentes. Merecem, pois, esta taça de champanhe.

Sem comentários:

Enviar um comentário