1. É sabido que os políticos desencadeiam ódios e
paixões, e poucas são as pessoas que lhes ficam indiferentes. Porém, o
sentimento que, em geral, se nutre pelos políticos depende da posição em que
cada um se coloca, se adepto, se adversário.
2. Os apoiantes de um político exaltam-lhes as
qualidades, seguem-no com entusiasmo, alcandoram-no aos píncaros,
transformando-o em ídolo. Por sua vez, os adversários fazem o contrário: destacam-lhe
eventuais defeitos, correm em busca de pontos fracos, rebaixam-no à mais ínfima
condição. Chegam mesmo a diabolização.
3. Margaret Thatcher, a ex-Primeira-ministra do Reino
Unido, recentemente falecida, tornou-se um exemplo acabado da bipolarização de
sentimentos. Ela não foi incapaz de gerar consensos, pelas políticas económicas
radicais que implementou. Na Era Margaret Thatcher, desregulamentou-se o sector
financeiro, flexibilizou-se o mercado de trabalho e foi grande a agressividade na
privatização das empresas estatais.
4. Que eu saiba, o único político que se tornou
consensual foi Nelson Mandela, pelo que fez, pelo exemplo que deu ao mundo.
Qualquer outro político não se escapa de integrar a regra geral: estimular
ódios ou desencadear paixões. Inclusive, Barack Obama, Presidente
norte-americano, que é visto por alguns dos seus compatriotas como a encarnação
do “anti-Cristo”.
5. É, pois, compreensível, que a humanidade esteja ansiosa
pelo surgimento de um outro Mandela, que nos una a todos, materializando,
assim, a ideia de Humanidade. Mas, voltemos a Margaret Thatcher, mulher
política feita Baronesa pela Rainha do Reino Unido, e que deixou um legado não
consensual.
6. A crise petrolífera de 1979 que emergiu com a
revolução islâmica no Irão – que desorganizou o sector petrolífero e fez os
preços do crude subirem assustadoramente – apanhou o primeiro mandato de
Margaret Thatcher no seu início. O Reino Unido entrou em recessão económica.
7. Vários foram os fantasmas que ensombraram os mandatos
de Margaret Thatcher, o maior dos quais foi, sem dúvida, a inflação. Entre 1979
e 1980, a
inflação duplicou, passando de 10% para 20%. Seguiu-se um período de relativo controlo
desse indicador. Porém, no final da década de 1980, a inflação retomou os
dois dígitos, corroendo os rendimentos, sobretudo, dos mais pobres. Por norma,
a inflação atinge todos, mas, a sua maior vítima é, inquestionavelmente, o
sector economicamente mais débil.
8. O período de relativo controlo da inflação por parte
do governo conservador de Margaret Thatcher coincidiu com a recuperação da
cotação da moeda nacional, a libra esterlina. A contrapartida à melhoria da
cotação da libra esterlina foi, porém, o aumento das importações, pela perda de
competitividade da indústria nacional. Os adeptos da “Dama de Ferro”, como era
chamada, dizem que as indústrias que morreram tinham mesmo que morrer, pois
eram ineficientes e a economia tinha que se modernizar. Uma modernização que
acarretou enormes custos sociais: aumentou o desemprego.
9. Para fazer face à crise, Margaret Thatcher introduziu políticas
económicas que fazem dela um verdadeiro ícone do liberalismo económico. Até
hoje em que o “thatcherismo” tem muitos acólitos, ela é a grande referência do
neo-liberalismo.
10.
Uma das
chaves-mestras do “thatcherismo” foi a redução da influência dos sindicatos.
Com isso, conseguiu praticamente abolir o salário mínimo, posteriormente (em
1999) reposto pelo trabalhista Tony Blair.
11.
Margaret
Thatcher promoveu também substanciais cortes orçamentais nos sectores sociais. Foi
uma quase assumida adversária do Estado Social, conforme revelam documentos recentemente
tornados públicos. Um desígnio que é irónico, dada a sua origem social modesta:
era filha de um simples merceeiro.
12.
A sua
política fiscal ilustra também a lógica do seu raciocínio: redução dos impostos
sobre os rendimentos (impostos esses que decresciam à medida que aumentava o
nível dos rendimentos) e sobre a propriedade, e o aumento dos impostos sobre o
consumo.
13.
A ex-Primeira-ministra
britânica exaltava as virtudes do mercado livre e os méritos da chamada “ordem
espontânea”, na linha daquele que assumia como seu ideólogo, Friedrich Hayek, e
também de Milton Friedman. Esteve sempre em consonância com as políticas
económicas seguidas por Ronald Reagan, nos Estados Unidos da América.
14.
O balanço
económico e social da Era Margaret Thatcher pode ser resumido nos seguintes
termos: i) Baixa da produção industrial, com fortes reflexos no aumento do
desemprego; ii) Aumento da assimetria nos rendimentos e consequente deterioração
do Coeficiente de Gini; iii) Aumento do número dos mais pobres iv) Crescimento
do número de crianças abaixo da linha da pobreza.
15.
Há quem a idolatre apresentando uma outra
visão do mundo que ela criou: artífice da modernização da economia britânica.
Talvez isso explique o porquê de a morte de Margaret Thatcher ter sido
lamentada por uma parte da população britânica e festejada por outra parte.
16. Mas uma coisa é inegável: as suas
políticas económicas e sociais constituíram realmente uma verdadeira rotura com
o modelo que vinha sendo construído na Europa. Um tempo que, afinal, não é assim
tão longínquo. E ela disseminou, realmente, muitos seguidores que a procuram
imitar, nesta período em que a moda é a destruição do Estado Social na Europa.
Muito obrigada!
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