O ABISMO FISCAL NORTE-AMERICANO
- Nos últimos dias, e
a propósito da recente evolução da economia dos EUA, é muitas vezes
repetida a expressão “abismo fiscal”, ou então, “precipício orçamental”, em
referência ao desajuste nas contas públicas da maior economia do mundo.
Pela carga demasiado negativa da expressão, adivinha-se já a eminência de
algo muito profundo e mau – a não aprovação atempada do Plano Orçamental
dos EUA para o ano de 2013. Com a não aprovação desse Plano Orçamental,
pensa-se, naturalmente, no eventual regresso da recessão económica, tal
como sucedeu em 2007/2008, que abalou a sociedade e se reflectiu sobre o
mundo.
- A associação da recessão
económica com o abalo social de modo algum é um raciocínio precipitado,
pois, a estabilidade económica e a paz social também se articulam numa
justa medida.
- A fórmula
apresentada pelos democratas é a seguinte: i) pôr fim aos incentivos
fiscais implementados há cerca de 10 anos pela Administração Bush; ii)
aumentar os impostos que recaem sobre os mais ricos; iii) reduzir
determinados gastos que não colidam com o bem-estar dos cidadãos em geral
e, em especial, da classe média.
- Por sua vez, o
modelo dos republicanos (que dominam a Câmara dos Representantes) é; i)
manutenção das actuais isenções fiscais; ii) não penalização fiscal dos
mais ricos; iii) redução da despesa pública, inclusive, com cortes nos
gastos sociais. Um dos seus alvos é, precisamente, o sistema de saúde
feito aprovar pelo Presidente Barack Obama e, que de algum modo,
contribuiu para a sua reeleição. Colocam ainda a questão da não elevação
do tecto da dívida pública, conforme solicitação do Presidente, com vista
a impulsionar o crescimento da economia.
- Ao contrário do que
muita gente possa pensar, estamos perante uma marcada diferença ideológica
entre os dois campos políticos norte-americanos. De um lado, os democratas
que acham que o sacrifício para a reposição do equilíbrio orçamental deve
ser feito com o forte contributo dos mais ricos – daí que eles devam
abdicar de parte dos seus benefícios, e perder algumas das isenções
fiscais concedidas por George W. Bush. A ideia dos democratas vai ainda no
sentido de expandir o consumo e ser este a estimular o investimento. Os
democratas pensam também que o estado tem uma função social, deve
preocupar-se com o bem-estar dos mais débeis, não os expondo totalmente aos
apetites do sector privado.
- Os republicanos
julgam que, ao manter as isenções fiscais, e ao desagravar os impostos dos
mais ricos, estarão a criar as condições para a promoção da poupança e,
consequentemente, do investimento. É isso que gerará mais oferta e mais
emprego. O seu ponto de honra assenta ainda em debilitar o actual sistema
de seguros de saúde (o Medicare), que afirmam ser demasiado proteccionista.
- O Medicare é o
sistema de seguros de saúde gerido pelo governo dos EUA e destinado às
pessoas de idade igual ou superior a 65 anos ou que se verifique possuam
baixos rendimentos e sejam portadoras de deficiência ou que sofram de
doença renal grave.
- Na sua formulação
inicial, o Medicare começou o seu percurso em 1965, ainda na vigência do
Presidente Lindon Johnson. O actual Presidente norte-americano, Barack
Obama, usou-o como uma das suas bandeiras eleitorais, tendo mesmo
conseguido alargar o seu âmbito. Pretende agora reforçar os seus recursos,
até ao ano de 2020.
- A ideia defendida
pelos republicanos é a de diminuir a expressão do Medicare: i) o governo
deixaria de pagar as contas médicas principais e passaria a dar um bónus
para ser usado na compra de cobertura médica particular; ii) no caso do bónus
se mostrar insuficiente para cobrir a despesa de saúde do cidadão, então,
a solução do problema ficaria pura e simplesmente na mão do cidadão, que
estaria, pois, de certa forma, desprotegido. Trata-se de um Medicare
alternativo – teoricamente mais em consonância com o dogma liberal do
mercado livre.
- Até ao momento,
ainda não se vê uma luz no fundo do túnel… Os dois campos estão a jogar os
seus trunfos. Mas, o sinal dado pelo eleitorado em Novembro pode ser aproveitado
pelo Presidente Obama que viu aprovado o essencial das suas propostas.
- O esticar a corda
pelos republicanos pode mesmo vir a penalizá-los em eleições futuras,
recaindo sobre os seus ombros o ónus de uma eventual crise económica que venha
a emergir nos próximos tempos.
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