UMA VERDADEIRA LUFADA DE AR FRESCO
- A honestidade
intelectual e o espírito autocrítico são alguns dos predicados dos grandes
homens. Nelson Mandela, por exemplo, demonstrou possuir ambos quando, a
propósito de estar a ser tido quase como um semi-deus, disse: “Isso foi
uma das coisas que me preocuparam – ter ascendido à posição de semi-deus –
pois daí em diante você não é mais um ser humano. Eu queria ser conhecido
apenas como Mandela, um homem com fraquezas, algumas das quais são
fundamentais, e um homem que é engajado”.
- Agora, nos últimos
dias, um renomado cientista norte-americano, Richard Muller, Professor de
Física na Universidade de Berkeley, na Califórnia, até há pouco tempo tido
como um cientista céptico relativamente à responsabilidade dos seres
humanos no aquecimento global do nosso planeta, alterou o seu
posicionamento, tendo, em artigo de opinião no New York Times, escrito a
seguinte frase: “Não esperava isto, mas, como cientista, acho que é meu
dever permitir que a evidência mude a minha opinião”. No passado, Richard
Muller não só desresponsabilizava o papel do homem no aquecimento global
como punha mesmo em causa a própria existência do aquecimento global. Em
claro tom autocrítico, ele define-se, agora, como um “céptico convertido”.
- Há poucos anos,
escrevi um texto de opinião (ou talvez até mesmo mais de um texto) em que
me debruçava sobre a problemática do aquecimento global. Terá sido,
segundo me lembro, aquando de uma reunião cimeira mundial dedicada à
definição de estratégias e políticas para o seu combate. Fi-lo, reconheço,
suportado pela minha relativa ignorância em relação a essa matéria.
- Como é meu apanágio,
pretendi apenas sensibilizar a nossa opinião pública para os riscos que
todos corremos, caso os grandes decisores mundiais não tomem as medidas julgadas
as mais adequadas e urgentes. Limitei-me, naturalmente, a colocar a tónica
na dimensão económica dessa questão – como é minha obrigação. Como não
podia ser de outro modo, o restante espaço científico ficaria ao cuidado dos
argumentos dos físicos, dos ecologistas e de outros especialistas
correlacionados.
- Infelizmente, a
minha abordagem não teve a pretendida sequência, talvez porque a questão
ainda não prenda devidamente a atenção da maioria dos nossos
“opinion-makers”, possivelmente mais preocupados, por enquanto, com outras
matérias eventualmente mais apaixonantes. Mesmo assim, mantenho a
esperança de que as questões ambientais venham a fazer parte, no futuro,
das pautas políticas e sociais do nosso país.
- Hoje, facilmente se
percebe que, por vezes, alguns pesquisadores são capazes de desvalorizar a
busca da verdade científica e pautar o seu trabalho na base de outros valores
e referências. Por exemplo, já houve quem tenha obedecido mais aos interesses
egoístas do fortíssimo lobby do tabaco, tendo feito parecer que o consumo
do tabaco não seria o responsável pela disseminação do cancro nos pulmões.
Também o ex-Presidente norte-americano, George W. Bush, procurou justificar
a sua recusa em assinar o Protocolo de Kioto em pareceres de especialistas
que põem em causa o papel da acção humana no aquecimento global. Sabe-se
agora, porém, que alguns desses pesquisadores não passam de “agentes
infiltrados” pelo lobby das petrolíferas e de outras grandes multinacionais,
nomeadamente, da indústria automóvel, verdadeiros motores da economia
norte-americana.
- Vale a pena recordar
também o papel desempenhado pelo ex-Vice-Presidente norte-americano, Al
Gore, na sua tarefa de chamar a atenção do mundo para os riscos ambientais
decorrentes do aquecimento global. No documentário que o celebrizou (mais
até que no seu papel de Vice-Presidente), Al Gore ancorou-se em 3 pilares:
i) Milhares de estudos científicos têm provado que o aquecimento global é
uma realidade e constitui uma séria ameaça para a vida do nosso planeta;
ii) Que, ao contrário do que afirmam certas correntes, políticas públicas
correctas e consistentes baseadas no planeamento ambiental podem, sim,
estimular as economias dos países; iii) Que o aquecimento global não é
somente um ciclo natural da vida da Terra, mas, sim, o resultado das
actividades humanas no campo industrial, sendo o recurso aos combustíveis
fósseis o seu principal responsável.
- O primeiro pilar da denúncia
de Al Gore foi confirmado pelo desastre provocado pelo furacão Katrina que
varreu literalmente a histórica cidade norte-americana de Nova Orleães. O
segundo pilar tem respaldo num trabalho apresentado pelo Programa das
Nações Unidas para o Ambiente onde se mostra que é possível, sim, criar
inúmeros empregos associados à implementação de energias limpas e
renováveis.
- O recente
posicionamento do Professor Richard Muller tornou-se um grande reforço
para a corrente mundial que se vem batendo pela preservação do ambiente e
para que a vida não vá, paulatinamente, desaparecendo do nosso planeta,
fruto da actividade depredadora e destruidora do homem.
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