segunda-feira, 20 de abril de 2009

A BÊNÇÃO DOS RECURSOS HUMANOS

JUSTINO PINTO DE ANDRADE (21/04/09)

1. Durante 2 dias, decorreu em Luanda uma “Conferência Nacional sobre Educação” que contou com a participação de dois convidados estrangeiros, o Dr. Kossi Adubra, representante regional da UNESCO, a Organização das Nações Unidas para a Ciência e Cultura, e o Dr. José Marcelino Rezende Pinto, vindo do Brasil onde é professor universitário. De certo modo, a presença destas duas personalidades conferiu um carácter internacional à Conferência, mesmo que a organizadora, a OPEN SOCIETY, tenha optado por lhe dar uma denominação menos abrangente, chamando-lhe apenas Conferência Nacional. Esses são, porém, pormenores que em nada diminuem a importância da discussão que se fez em torno de uma das pedras basilares para a construção do nosso país: a educação.

2. A intenção da Conferência foi a análise do estado da educação no nosso país, na perspectiva do cumprimento dos objectivos definidos em algumas ocasiões históricas, como sejam: o “Encontro Mundial sobre Educação”, de Jomtien, na Tailândia, no ano de 1990; a “Cimeira Mundial de Educação”, de 26 a 28 de Abril de 2000, em Dakar, no Senegal; e a chamada “Cimeira do Milénio”, de Setembro de 2000, em Nova Iorque, na qual se definiram os conhecidos “Objectivos de Desenvolvimento do Milénio”, um compromisso assumido pelos dirigentes de 189 Estados.

3. Eu estive presente no grande encontro de Jomtien, na Tailândia, enquadrado na delegação angolana chefiada pelo então Ministro da Educação, Eng. Augusto Lopes Teixeira, já são passadas quase duas décadas. Neste Conferência, pontificou uma figura grada da investigação histórica do nosso Continente, o Professor Joseph Ki-Zerbo, o Burquina Fasso, um dos co-autores da História Geral de África, infelizmente já desaparecido.

4. Todos os Protocolos assinados nestes eventos tiveram como respaldo os princípios definidos na “Declaração Universal dos Direitos Humanos”, adoptada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948, no rescaldo da grande hecatombe mundial que foi a Segunda Grande Guerra. No seu preâmbulo, a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” diz explicitamente que cada indivíduo e cada órgão da sociedade devem esforçar-se, por meio do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, adoptando medidas progressivas de carácter nacional e internacional, para que eles se tornem universais e efectivos. No 1º parágrafo do artigo nº 26, a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” também dispõe, taxativamente: “Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito”.

5. Dos 8 Objectivos traçados pela “Cimeira do Milénio”, 2 deram substância à Conferência sobre Educação recentemente terminada em Luanda, nomeadamente: o 2º Objectivo que orienta os países no sentido de garantirem o ensino primário completo a todos os rapazes e raparigas; o 3º Objectivo que se reporta especificamente à promoção da igualdade de género e a autonomização da mulher, por meio do acesso ao ensino de qualidade. Esta última questão mereceu um especial destaque por parte dos presentes, e, muito em particular, de uma das participantes à Conferência, uma mulher aparentemente de condição humilde, engajada na promoção da alfabetização das mulheres na Província do Bengo. A determinada altura, essa perspicaz mulher pediu a palavra para referir o facto de o ensino no meio rural carecer ainda de qualidade. Por isso, sugeriu um melhor acompanhamento pelas entidades responsáveis. Fez, igualmente, referência aos vários entraves de carácter cultural e social que dificultam o acesso da mulher rural à alfabetização, obstaculizando, pois, o alcance do 3º Objectivo definido na “Cimeira do Milénio”.

6. A chamada “Declaração de Dakar”, saída da “Cimeira Mundial de Educação de Dakar” mostra-se também um documento imprescindível para o alcance desse grande e nobre desígnio que é uma Educação Para Todos, para cada cidadão e para cada sociedade. Ela constitui um compromisso colectivo para a acção, definindo a responsabilidade dos governos na materialização dos seus objectivos e metas. Para tal, recomenda o estabelecimento de “amplas parcerias no âmbito de cada país”, contando ainda com a cooperação de agências e instituições regionais e internacionais.

7. A “Declaração de Dakar” reconhece a educação enquanto direito humano fundamental, sublinhando ser ela “a chave para o desenvolvimento sustentável, assim como para assegurar a paz e a estabilidade dentro e entre países e, portanto, um meio indispensável para alcançar a participação efectiva nas sociedades e economias do século XXI”. Este postulado coloca-nos face a um compromisso que deve ser atingido nos marcos temporais estabelecidos – ou o mais próximo possível deles – sob pena de comprometermos o nosso desenvolvimento e até mesmo a paz e a estabilidade social. Compete, pois, às entidades oficiais tudo fazerem para a mobilização da vontade nacional e internacional com vista ao alcance desse grande desígnio que é a “Educação Para Todos”, ele também um dos pressupostos do êxito do desenvolvimento sustentável e do combate à pobreza.

8. Da “Conferência Nacional sobre Educação”, auspiciada pela OPEN SOCIETY, saíram recomendações que reputo importantes, tais como: i) A urgência de um maior engajamento dos meios de comunicação social nas questões ligadas à educação; ii) O aumento da participação da sociedade civil na monitoria das políticas e orçamentos da educação; iii) Também a participação activa do nosso Parlamento na monitoria e fiscalização das políticas do sector de educação; iv) O aumento da dotação orçamental destinada ao sector da educação, um sector que beneficia ainda de uns minúsculos 7% do total, quando outros países africanos ultrapassam mesmo os 20%, num claro e louvável esforço para se ultrapassar o nosso atraso secular.

9. O desafio da “Educação Para Todos” é um dos mais importantes deste início do século XXI, quando já se entende melhor que a maior e a mais valiosa bênção de um povo são os seus recursos humanos, eles próprios os principais responsáveis do desenvolvimento harmonioso, inclusivo e sustentável. Não nos empenharmos neste combate é sermos co-responsáveis pelo atraso e a dependência em que nos encontramos, vivendo a ilusão da abundância dos recursos naturais…



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