quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

UM XADREZ MUITO COMPLICADO


1.  A política europeia diz respeito, sobretudo, aos governos e aos povos europeus. Contudo, pela sua relevância, ela também interfere na dinâmica política da grande maioria dos restantes países do mundo. Estamos, pois, todos inseridos num mundo cada vez mais globalizado, e qualquer alteração nas peças do “tabuleiro do xadrez europeu” repercutir-se-á, mais ou menos profundamente, um pouco por todo o lado.

 

2.  No “tabuleiro do xadrez europeu” há peças que se assemelham às categorias mais valiosas, como Reis e Rainhas, mas, também, Bispos, Cavalos e Torres. Ele conta ainda com um certo número de Peões que, de certa forma, servem de protecção às peças de maior importância estratégica, sendo ainda, por vezes, usadas em lances de avanço.

 

3.  São os seguintes os países que adoptaram o Euro como moeda comum: Alemanha, França, Itália, Espanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Finlândia, Grécia, República da Irlanda, Portugal, Lituánia, Letónia, Malta e Países Baixos (Holanda). Mas também existem países não-membros da Zona Euro, cujas moedas nacionais estão indexadas ao Euro. São os casos de Cabo Verde, Bósnia e Herzegovina, também as antigas colónias africanas de França, antes indexadas ao franco francês e, agora, vinculadas ao Euro.

 

4.  A actual controvérsia que envolve a Grécia e seus parceiros da Zona Euro parece, pois, um verdadeiro jogo de xadrez, com visíveis estratégias de avanço sobre o terreno adversário, com vista a se obterem posições mais favoráveis. O desfecho deste jogo não me parece que venha a culminar num verdadeiro xeque-mate.

 

5.  O xeque-mate é aquela circunstância em que se bloqueia completamente o Rei, sem a cobertura de alguma outra peça, e não podendo mover-se para qualquer outra casa sem ser tomado por uma peça do adversário. Caso se desse xeque-mate à Grécia haveria, de imediato, consequências desastrosas para a União Europeia, mais particularmente para a Zona Euro. A moeda única sairia fragilizada face às restantes moedas concorrentes, nomeadamente, o Dólar, o Yene e a Libra inglesa.

 

6.  Não se pode colocar fora de hipótese a possibilidade de, mais tarte ou mais cedo, a Grécia sair da Zona Euro, mesmo que a presente negociação com o Eurogrupo tenha conduzido a um acordo temporário. Mas, uma coisa é quase certa: se, por acaso, a Grécia vier a sair do Euro, então, outros países lhe seguirão o caminho, sendo desde já os mais elegíveis para um tal destino, Portugal, Espanha, Chipre ou, inclusive, a Irlanda.

 

7.  A saída de um qualquer desses países da Zona Euro traduzir-se-á no regresso às antigas moedas nacionais, complicando, de novo, as relações financeiras internacionais, pois terão que se definir novas paridades para as moedas emergentes, com inevitáveis custos para o comércio internacional.

 

8.  Além dessa implicação de carácter económico e financeiro, a saída dos chamados “pequenos” na Zona Euro poderia também ser o prelúdio do ruir de todo o edifício europeu, começado a construir após o final da II Guerra Mundial, como forma de promover a paz entre as nações europeias e, também, desenvolver o seu potencial económico, tornando a Europa o centro da política e da economia mundial.

 

9.  Como seria previsível, a Europa confronta-se agora, talvez, com o seu maior desafio, ao acolher no seu seio um governo que, ideologicamente, foge ao paradigma até então prevalecente e que foi gizado por políticos de centro-direita e de centro-esquerda, oscilando entre uma ideologia mais ou menos liberal e uma ideologia social-democrata. A dita esquerda radical grega tem pelo menos o mérito de ter introduzido um novo debate que marca os tempos modernos, mesmo que tenha sido coagida a fazer determinadas cedências.

 

10.                  Acredito que o próximo confronto político europeu venha a conhecer novos protagonistas, vindos da extrema-direita, especialistas em propostas desagregadoras, xenófobas e estimuladoras de fortes convulsões sociais. E, então, o xadrez ainda se complicará mais…

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

OS MERCADOS DIFICILMENTE SE DEIXAM ILUDIR


1.  A redução das receitas provenientes da exportação do petróleo gerou uma extraordinária pressão sobre a nossa economia, obrigando mesmo a uma revisão do Orçamento Geral do Estado (OGE), pouco mais de dois meses após ter sido aprovado na Assembleia Nacional, com o voto unânime da bancada do MPLA. Tratou-se, de facto, de uma aprovação precipitada pois, na altura, já era perfeitamente perceptível a trajectória descendente do preço do petróleo no mercado internacional, embora ainda não se pudesse acertar onde o mesmo estabilizaria.

 

2.  A responsabilidade pela quebra das receitas petrolíferas de modo algum pode ser atribuída a um qualquer dirigente político ou económico angolano. Assim como qualquer outra oscilação no preço, jamais seria assacada ao volume das nossas exportações, grande para a nossa economia interna, mas mediano se comparado com o dos grandes produtores e exportadores mundiais.

 

3.  A presente variação no preço do petróleo deve-se, sim, à conjuntura do mercado, onde se assinala o aumento dos níveis de produção interna dos EUA – que fez reduzir acentuadamente a sua dependência das importações –, conjugado com a redução da procura por parte da China - hoje o maior importador desse produto estratégico -, também à desaceleração de outras economias emergentes, assim como ao fraco desempenho económico das principais economias europeias. Tudo isso motivou o presente abalo económico em Angola e em outras economias fortemente dependentes das suas receitas.

 

4.  Coincidentemente, a redução das nossas receitas de exportação do petróleo foi seguida de um abanão na estrutura da equipa económica que governa Angola, sendo substituída a totalidade do governo do Banco Central, o BNA. Pode-se daí deduzir que a gestão das nossas divisas não teria, eventualmente, sido do agrado do Chefe do Executivo, uma a ideia que faz todo sentido, dado que nos Ministérios das Finanças, do Planeamento e outros correlacionados se mantêm os anteriores titulares.

 

5.  Creio que com a intenção de acalmar os mercados, o novo governador do BNA fez declarações optimistas, dando a entender que o abalo nas receitas de exportação não estaria a ter repercussões significativas na economia, que as restrições que se sentiam no mercado cambial e financeiro seriam da inteira responsabilidade dos seus gestores.

 

6.  Mas o Governador do BNA foi, de imediato, contrariado quer pela dura realidade, quer por declarações públicas de responsáveis do sector bancário, a começar pelo PCA do principal banco do Estado, o BPC, que se enrolou perante a comunicação social, deixando transparecer que, de facto, havia constrangimentos nas transferências e em outras movimentações financeiras envolvendo cambiais. E o imbróglio aumentou, quando outros responsáveis, com destaque para a actual Ministra do Comércio, se começaram a pronunciar, anunciando cortes nas importações e outras medidas restritivas.

 

7.  Tomando nota do mau momento vivido pelo país, o mercado paralelo de divisas reanimou, e a taxa de câmbio do dólar face ao kwanza quase que dobrou. O BNA teve que reagir, injectando mais divisas no mercado, para contrariar tal tendência de subida que levaria, inexoravelmente, a um disparo da taxa de inflação.

 

8.  São já indesmentíveis os estragos produzidos pela quebra do preço do petróleo no mercado internacional. Alguns deles repercutem-se sobre os nossos parceiros, sendo Portugal, sem sombra de dúvidas, um dos mais atingidos, pois algumas das suas cerca de 10.000 empresas relacionadas com o nosso país, estão já a recorrer à ajuda da banca com capitais angolanos instalada em Portugal, para resolverem problemas de tesouraria. Fazem-no sob a forma de pedidos de adiantamentos, a serem ressarcidos posteriormente, quando as transferências bancárias de divisas fluírem com maior regularidade.