quarta-feira, 26 de maio de 2010

AS AGÊNCIAS DE RATING

1. A partir de agora, passaremos a conviver com uma nova entidade, as denominadas “agências de rating”, ou “agências de classificação do risco de crédito”, entre outras designações. Isto porque, pela primeira vez, três “agências de rating” classificaram o risco soberano do nosso país.

2. Uma “agência de rating” é uma entidade que atribui notas classificativas aos países, expressando a capacidade de solvência das dívidas contraídas. São, pois, agências de notação financeira que podem também atribuir notas classificativas a empresas, e até mesmo a municípios, desde que estes possuam personalidade jurídica bastante que lhes permita financiarem-se no mercado financeiro internacional. Com tais notações, as “agências de rating” indiciam a capacidade das empresas, ou dos países, de pagarem as suas dívidas (o principal e os juros), no prazo estabelecido.

3. A classificação do risco é feita a pedido, podendo, depois, a nota ser revista para cima, ou para baixo, face a eventuais alterações. Tratando-se de um país, as “agências de rating” tomam em consideração o seu potencial económico, as suas perspectivas de crescimento, a sua saúde fiscal, o estado das finanças externas, etc.

4. No caso de Angola, para além dessas considerações, houve também em conta a nossa capacidade institucional, o histórico da implementação de reformas políticas e a incerteza quanto a uma eventual transição política. Nestes três domínios, prevaleceu o cepticismo.

5. Porém, o nosso país beneficiou do facto de deter no seu subsolo substanciais recursos naturais e de ter registado nos últimos 8 anos um acentuado crescimento económico. Fizemos, igualmente, reconhecidos progressos no domínio macroeconómico. Dizem ainda as “agências de rating” que os rácios da dívida pública e da dívida externa de Angola são moderados.

6. A Moody’s, a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings são as “agências de rating” mais conhecidas internacionalmente, mesmo que não sejam as únicas.

7. As “agências de rating” utilizam classificações diferentes. Por exemplo, o C para a Moody’s é a pior classificação, e Aaa é a melhor classificação. Para a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings a melhor classificação será sinalizada com AAA, e a pior com D, o que significa uma alta probabilidade de o devedor não honrar o seu compromisso, no prazo acordado.

8. A Standard & Poor’s atribuiu a Angola uma classificação de B+ para o longo prazo e B para o curto prazo. A Fitch Ratings atribuiu B+ para o longo prazo e um “outlook” positivo. A Moody’s ficou-se por um B1 “not-prime”. O governo angolano havia solicitado a notação pelas agências de risco de crédito já no ano de 2009.

9. Nos últimos tempos, a credibilidade das agências de notação de risco tem sido posta em causa, pois têm falhado em alguns casos na avaliação do risco. Foi o que sucedeu, por exemplo, aquando da crise do subprime, a crise do sector imobiliário, com as hipotecas de alto risco, em que se fizeram avaliações elevadas e que depois se veio a verificar não serem verdadeiras. Hoje, os principais líderes mundiais começam a tomar medidas para regulamentar melhor a actividade dessas agências.

10. Recentemente, o jornal americano New York Times afirmou que a Wall Street, a praça financeira norte-americana, no caso da Grécia, terá posto em prática métodos já utilizados no passado e que fomentaram a crise do subprime. Segundo diz o New York Times, durante uma década, com a ajuda de banqueiros de Wall Street, as autoridades gregas conseguiram iludir os limites da dívida estabelecida por Bruxelas, utilizando, para tal, a cobertura do banco de investimento Goldman Sachs.

11. A equipa que se dirigiu a Atenas, liderada pelo presidente do Goldman Sachs, terá oferecido às autoridades gregas um produto financeiro capaz de permitir ao país redistribuir parte da dívida do sistema de saúde, por forma a só ter de a enfrentar muito mais tarde. São também envolvidos neste esquema, o JPMorgan e outros bancos. Mas, retornemos a Angola.

12. A classificação que foi atribuída a Angola abre portas para uma acção de venda de títulos no mercado internacional, com um “spread” razoável. Dizendo mais facilmente, o custo da dívida contraída será menor do que aquele que obtêm os países com má figura no mercado financeiro internacional.

13. Porém, há que ter em atenção os eventuais impactos de um qualquer desleixo que nos possa levar a uma situação menos cómoda junto das instâncias financeiras internacionais. Sentiremos, então, uma reacção rápida dos mercados, que se traduzirá no seguinte: aumentará, e muito, a dificuldade de acesso ao crédito, e o custo do crédito que ainda recebermos será de tal modo incomportável que agravará ainda mais a nossa situação financeira.

AS AGÊNCIAS DE RATING

1. A partir de agora, passaremos a conviver com uma nova entidade, as denominadas “agências de rating”, ou “agências de classificação do risco de crédito”, entre outras designações. Isto porque, pela primeira vez, três “agências de rating” classificaram o risco soberano do nosso país.

2. Uma “agência de rating” é uma entidade que atribui notas classificativas aos países, expressando a capacidade de solvência das dívidas contraídas. São, pois, agências de notação financeira que podem também atribuir notas classificativas a empresas, e até mesmo a municípios, desde que estes possuam personalidade jurídica bastante que lhes permita financiarem-se no mercado financeiro internacional. Com tais notações, as “agências de rating” indiciam a capacidade das empresas, ou dos países, de pagarem as suas dívidas (o principal e os juros), no prazo estabelecido.

3. A classificação do risco é feita a pedido, podendo, depois, a nota ser revista para cima, ou para baixo, face a eventuais alterações. Tratando-se de um país, as “agências de rating” tomam em consideração o seu potencial económico, as suas perspectivas de crescimento, a sua saúde fiscal, o estado das finanças externas, etc.

4. No caso de Angola, para além dessas considerações, houve também em conta a nossa capacidade institucional, o histórico da implementação de reformas políticas e a incerteza quanto a uma eventual transição política. Nestes três domínios, prevaleceu o cepticismo.

5. Porém, o nosso país beneficiou do facto de deter no seu subsolo substanciais recursos naturais e de ter registado nos últimos 8 anos um acentuado crescimento económico. Fizemos, igualmente, reconhecidos progressos no domínio macroeconómico. Dizem ainda as “agências de rating” que os rácios da dívida pública e da dívida externa de Angola são moderados.

6. A Moody’s, a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings são as “agências de rating” mais conhecidas internacionalmente, mesmo que não sejam as únicas.

7. As “agências de rating” utilizam classificações diferentes. Por exemplo, o C para a Moody’s é a pior classificação, e Aaa é a melhor classificação. Para a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings a melhor classificação será sinalizada com AAA, e a pior com D, o que significa uma alta probabilidade de o devedor não honrar o seu compromisso, no prazo acordado.

8. A Standard & Poor’s atribuiu a Angola uma classificação de B+ para o longo prazo e B para o curto prazo. A Fitch Ratings atribuiu B+ para o longo prazo e um “outlook” positivo. A Moody’s ficou-se por um B1 “not-prime”. O governo angolano havia solicitado a notação pelas agências de risco de crédito já no ano de 2009.

9. Nos últimos tempos, a credibilidade das agências de notação de risco tem sido posta em causa, pois têm falhado em alguns casos na avaliação do risco. Foi o que sucedeu, por exemplo, aquando da crise do subprime, a crise do sector imobiliário, com as hipotecas de alto risco, em que se fizeram avaliações elevadas e que depois se veio a verificar não serem verdadeiras. Hoje, os principais líderes mundiais começam a tomar medidas para regulamentar melhor a actividade dessas agências.

10. Recentemente, o jornal americano New York Times afirmou que a Wall Street, a praça financeira norte-americana, no caso da Grécia, terá posto em prática métodos já utilizados no passado e que fomentaram a crise do subprime. Segundo diz o New York Times, durante uma década, com a ajuda de banqueiros de Wall Street, as autoridades gregas conseguiram iludir os limites da dívida estabelecida por Bruxelas, utilizando, para tal, a cobertura do banco de investimento Goldman Sachs.

11. A equipa que se dirigiu a Atenas, liderada pelo presidente do Goldman Sachs, terá oferecido às autoridades gregas um produto financeiro capaz de permitir ao país redistribuir parte da dívida do sistema de saúde, por forma a só ter de a enfrentar muito mais tarde. São também envolvidos neste esquema, o JPMorgan e outros bancos. Mas, retornemos a Angola.

12. A classificação que foi atribuída a Angola abre portas para uma acção de venda de títulos no mercado internacional, com um “spread” razoável. Dizendo mais facilmente, o custo da dívida contraída será menor do que aquele que obtêm os países com má figura no mercado financeiro internacional.

13. Porém, há que ter em atenção os eventuais impactos de um qualquer desleixo que nos possa levar a uma situação menos cómoda junto das instâncias financeiras internacionais. Sentiremos, então, uma reacção rápida dos mercados, que se traduzirá no seguinte: aumentará, e muito, a dificuldade de acesso ao crédito, e o custo do crédito que ainda recebermos será de tal modo incomportável que agravará ainda mais a nossa situação financeira.

AS AGÊNCIAS DE RATING

1. A partir de agora, passaremos a conviver com uma nova entidade, as denominadas “agências de rating”, ou “agências de classificação do risco de crédito”, entre outras designações. Isto porque, pela primeira vez, três “agências de rating” classificaram o risco soberano do nosso país.

2. Uma “agência de rating” é uma entidade que atribui notas classificativas aos países, expressando a capacidade de solvência das dívidas contraídas. São, pois, agências de notação financeira que podem também atribuir notas classificativas a empresas, e até mesmo a municípios, desde que estes possuam personalidade jurídica bastante que lhes permita financiarem-se no mercado financeiro internacional. Com tais notações, as “agências de rating” indiciam a capacidade das empresas, ou dos países, de pagarem as suas dívidas (o principal e os juros), no prazo estabelecido.

3. A classificação do risco é feita a pedido, podendo, depois, a nota ser revista para cima, ou para baixo, face a eventuais alterações. Tratando-se de um país, as “agências de rating” tomam em consideração o seu potencial económico, as suas perspectivas de crescimento, a sua saúde fiscal, o estado das finanças externas, etc.

4. No caso de Angola, para além dessas considerações, houve também em conta a nossa capacidade institucional, o histórico da implementação de reformas políticas e a incerteza quanto a uma eventual transição política. Nestes três domínios, prevaleceu o cepticismo.

5. Porém, o nosso país beneficiou do facto de deter no seu subsolo substanciais recursos naturais e de ter registado nos últimos 8 anos um acentuado crescimento económico. Fizemos, igualmente, reconhecidos progressos no domínio macroeconómico. Dizem ainda as “agências de rating” que os rácios da dívida pública e da dívida externa de Angola são moderados.

6. A Moody’s, a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings são as “agências de rating” mais conhecidas internacionalmente, mesmo que não sejam as únicas.

7. As “agências de rating” utilizam classificações diferentes. Por exemplo, o C para a Moody’s é a pior classificação, e Aaa é a melhor classificação. Para a Standard & Poor’s e a Fitch Ratings a melhor classificação será sinalizada com AAA, e a pior com D, o que significa uma alta probabilidade de o devedor não honrar o seu compromisso, no prazo acordado.

8. A Standard & Poor’s atribuiu a Angola uma classificação de B+ para o longo prazo e B para o curto prazo. A Fitch Ratings atribuiu B+ para o longo prazo e um “outlook” positivo. A Moody’s ficou-se por um B1 “not-prime”. O governo angolano havia solicitado a notação pelas agências de risco de crédito já no ano de 2009.

9. Nos últimos tempos, a credibilidade das agências de notação de risco tem sido posta em causa, pois têm falhado em alguns casos na avaliação do risco. Foi o que sucedeu, por exemplo, aquando da crise do subprime, a crise do sector imobiliário, com as hipotecas de alto risco, em que se fizeram avaliações elevadas e que depois se veio a verificar não serem verdadeiras. Hoje, os principais líderes mundiais começam a tomar medidas para regulamentar melhor a actividade dessas agências.

10. Recentemente, o jornal americano New York Times afirmou que a Wall Street, a praça financeira norte-americana, no caso da Grécia, terá posto em prática métodos já utilizados no passado e que fomentaram a crise do subprime. Segundo diz o New York Times, durante uma década, com a ajuda de banqueiros de Wall Street, as autoridades gregas conseguiram iludir os limites da dívida estabelecida por Bruxelas, utilizando, para tal, a cobertura do banco de investimento Goldman Sachs.

11. A equipa que se dirigiu a Atenas, liderada pelo presidente do Goldman Sachs, terá oferecido às autoridades gregas um produto financeiro capaz de permitir ao país redistribuir parte da dívida do sistema de saúde, por forma a só ter de a enfrentar muito mais tarde. São também envolvidos neste esquema, o JPMorgan e outros bancos. Mas, retornemos a Angola.

12. A classificação que foi atribuída a Angola abre portas para uma acção de venda de títulos no mercado internacional, com um “spread” razoável. Dizendo mais facilmente, o custo da dívida contraída será menor do que aquele que obtêm os países com má figura no mercado financeiro internacional.

13. Porém, há que ter em atenção os eventuais impactos de um qualquer desleixo que nos possa levar a uma situação menos cómoda junto das instâncias financeiras internacionais. Sentiremos, então, uma reacção rápida dos mercados, que se traduzirá no seguinte: aumentará, e muito, a dificuldade de acesso ao crédito, e o custo do crédito que ainda recebermos será de tal modo incomportável que agravará ainda mais a nossa situação financeira.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

SALDANHA SANCHES FAZ AGORA PARTE DA HISTÓRIA

(UM DIA ALGUÉM ESCREVEU NOS MUROS DE LISBOA:
“O POVO LIBERTARÁ SALDANHA SANCHES”)

Dedicatória:
Aos meus amigos, Diana Andringa e Fernando Rosas, seus amigos e companheiros de longa data.
À Doutora Maria José Morgado, esposa de tantos anos e de tantas caminhadas.



1. A morte do Professor Saldanha Sanches é mais um momento de dor. É mais uma vela que se apaga dos tempos da minha juventude. Ele em Portugal, e nós aqui, em Angola, lutámos todos contra o regime injusto e anacrónico que nos oprimia. Somos, pois, contemporâneos das mesmas causas: a luta contra o colonialismo e contra o fascismo que alimentava e se alimentava do colonialismo.

2. Poucos dos que me ouvem (ou lêem) sabem quem foi Saldanha Sanches, já porque ele não era angolano e porque também, nos últimos anos, limitou a sua intervenção pública quase apenas à análise política e económica, em alguns dos órgãos de comunicação social de Portugal.

3. Saldanha Sanches era um brilhante professor de Direito Fiscal e de Finanças Públicas na Universidade Clássica de Lisboa. Também na Universidade Católica Portuguesa. Desligado do activismo político directo, ainda assim, continuou a ser um referencial da democracia e da luta pela democracia portuguesa. Sempre que estivessem em jogo grandes decisões como, por exemplo, actos eleitorais, lá ele surgia a público, dando opinião sobre os actores em concorrência, sobre as propostas políticas, sobre as razões que estavam por detrás das propostas. Comunicava, também, a sua opção de escolha. Por isso, ele não era um absentista da política. Estava sempre atento.

4. No tempo em que a minha geração se batia, em Angola, pela independência, em Portugal, a geração do Saldanha Sanches lutava para pôr fim ao regime de Salazar e Caetano, que a todos nós oprimia. Estávamos, pois, do mesmo lado da barricada, fazendo parte de um cordão de solidariedade que se espalhava pelo mundo afora.

5. Os da nossa geração tivemos o privilégio de viver uma época extraordinária, onde a liberdade e a conquista de mais direitos para os homens e as mulheres de todos os continentes eram as grandes causas. Por isso, vivemos com emoção as transformações que o mundo foi sofrendo: as independências das colónias africanas; as lutas por mais direitos para as classes trabalhadoras na Europa e no continente americano; a emergência de novas nações na América Latina e na Ásia.

6. Fomos testemunhas dos desenvolvimentos por que passaram as democracias ocidentais. Vimos os negros norte-americanos a consentirem sacrifícios incomensuráveis para conquistarem mais espaço vital e mais justiça social. Vimos o fim de grandes impérios, o surgimento de novos actores globais, o desmascaramento de múltiplas falácias políticas. Caíram na nossa frente regimes que, em nome da liberdade para alguns, afinal, o que mais faziam era oprimir a todos…

7. Na nossa geração, deu-se um passo de gigante na busca de outros planetas. Hoje, o homem vai para o espaço, como se o destino fosse mesmo aqui ao lado… A igualdade do género é uma questão dos nossos dias – só um descompensado a pode pôr em causa... A luta por um ambiente mais saudável faz parte das nossas agendas. O fim das guerras destruidoras é um desígnio a ser perseguido como um alvo…

8. Entrámos na roda da história, fazendo parte dela. Não nos alheámos das grandes preocupações do nosso tempo. Temos sabido viver a nossa época, participando, contribuindo. Umas vezes falhando; outras, com acertos fundamentais. Era assim que eu olhava para o Saldanha Sanches, quando ele aparecia na televisão. Como um resistente e um sobrevivente.

9. Admirava-lhe a sagacidade, a liberdade de pensamento. Orgulho-me de ter sido contemporâneo das suas causas; e ele das minhas – mesmo que separados pela longa distância que vai de Angola a Portugal.

10. Lúcido, frontal, irreverente, destemido nas suas análises políticas. Celebrizou-se nos últimos tempos pela denúncia à injustiça do actual sistema fiscal português, à fuga ao pagamento dos impostos pelo esquema dos off-shores, o sigilo bancário que encobre a fraude. A sua opinião desassombrada apoquentava os prevaricadores.

11. O cancro maldito fez ao Professor Saldanha Sanches aquilo que a PIDE não conseguiu fazer ao jovem Saldanha Sanches: vencer a sua força indomável. O cancro levou-lhe a vida, mas não o apagou da história. O grande Saldanha Sanches faz, agora, parte da história.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

O EFEITO DOMINÓ

1. Na semana passada, escrevi sobre o que se passa actualmente na Europa. Mais concretamente, escrevi um texto sobre o momento difícil que a Grécia está a atravessar.

2. Algumas das pessoas que seguem os meus comentários e, sobretudo, os que ouvem (ou lêem) as minhas crónicas semanais, pediram-me que aprofundasse um pouco mais essa abordagem, pois a informação de que dispõem não é bastante para o mais prefeito entendimento. Satisfaço, pois, aqui, o seu pedido, movido não só pela intenção de os ajudar mas, também, de ajudar aqueles que, mesmo não se tendo manifestado, anseiam, ainda assim, por mais informação.

3. Disse na semana passada, e repito agora: de modo algum está posta de parte a ideia de a crise grega vir a provocar o chamado “efeito dominó”. Ou seja, o que sucede na Grécia pode vir a produzir um “efeito em cascata”, levando ao colapso, ou ao quase colapso, outras economias entrelaçadas. As que me parecem mais próximas deste resultado são, claramente, a espanhola e a portuguesa, pelas suas fortes conexões. Se a Espanha tombar, pela certa Portugal também tombará. Vamos, então, por partes.

4. Na última década, o anterior governo grego realizou gastos muito para além das suas reais possibilidades. Em consequência, criou uma dívida pública enorme que se situa já nos 300 mil milhões de euros, ou seja, perto dos 400 mil milhões de usd. Pedindo empréstimos sobre empréstimos, a economia grega tornou-se refém do seu próprio endividamento crescente.

5. Com dívida tão elevada, o país perdeu credibilidade, e os investidores passaram a ter grande relutância em emprestar mais dinheiro. E quando o fizeram, passaram a exigir, como contrapartida, juros cada vez mais altos. O país entrou, assim, no círculo vicioso de endividamento: endividar-se para pagar a dívida.

6. Seguramente, com o intuito de captar a simpatia da classe média – em especial dos funcionários públicos – o governo grego foi subindo os salários, duplicando-os, e o aumento da despesa pública não se fez acompanhar pelo aumento da receita. Antes pelo contrário, a receita não cresceu, porque se acentuou a evasão fiscal, ou seja, a fuga ao pagamento dos impostos.

7. Não se trata, portanto, apenas, de um problema da dívida pública. Ele tem também a ver com o défice fiscal e, igualmente, com a dívida privada (a dívida das empresas e dos bancos).

8. A dívida total da Grécia (a dívida publica mais a dívida privada) corresponde a 195% do seu PIB. Comparativamente aos restantes países “problemáticos” da Europa, ela nem é a mais elevada. Países como a Espanha (com 342% do PIB), e Portugal (com 236% do PIB), estão numa situação mais complicada, pelo menos no que diz respeito a este indicador. Além disso, são economias para quem se perspectiva um crescimento negativo, ou quase negativo, neste ano. A ser assim, complicar-se-á ainda mais a relação dívida/PIB, e terão cada vez mais dificuldades para honrar os seus compromissos.

9. O défice fiscal grego – se quisermos, o défice orçamental – atingiu altíssimos valores, situando-se num patamar mais de quatro vezes superior ao valor estabelecido para os países da Eurolândia, designação por que é conhecida a Zona Euro da União Europeia. Em 2009, o défice fiscal grego estava nos 13,6% do Produto Interno Bruto, e as regras europeias só admitem um défice até 3%.

10. São esses dados negativos que fizeram a classificação do risco-país da Grécia baixar para níveis preocupantes. Hoje, são sobretudo as componentes política e de mercado do sistema de avaliação do risco-país que lançaram a nação helénica no descrédito internacional. Por isso, têm sido unânimes as avaliações efectuadas pela Ficht Ratings, a Moody’s, e pela Standard & Poor’s, afinal, as três mais conhecidas agências de classificação de risco.

11. O actual governo grego está entalado “numa camisa de sete varas” – como se costuma dizer em linguagem mais popular. Para fazer face ao pesado serviço da dívida, o governo ainda se endivida mais. Procura, agora, o socorro de empréstimos concedidos pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional, empréstimos que são condicionados. Ou seja, receberá os fundos solicitados, desde que se comprometa a cortar na despesa pública, sobretudo no capítulo dos salários e pensões. Mas deverá, igualmente, reduzir os investimentos públicos e aumentar o número de anos para se passar à reforma, para reduzir a factura com as pensões.

12. O compromisso assumido pela Grécia com a União Europeia e o FMI impõe ainda a subida dos impostos e dos preços, uma matéria que é muito sensível para a generalidade dos consumidores. É isso que motiva a saída à rua de milhares e milhares de pessoas. São crescentes as contestações à cedência do governo ao pacote de medidas de austeridade. Sindicatos, organizações cívicas e partidos políticos estão por detrás desta onda contestatária.

13. Se é verdade que a situação actual da Grécia é, em parte, devida à política despesista e laxista do anterior governo, não deixa também de ser verdade que nesse, e noutros países europeus, se vive ainda o reflexo duradouro da crise económica e financeira desencadeada em inícios de 2008 e que se propagou um pouco por todo o mundo. Todos eles ainda pagam facturas atrasadas da crise que começou nos Estados Unidos da América com a problemática do “suprime”, a crise do sector imobiliário, quando os governos tiveram que socorrer os seus sectores financeiros mais em risco, aumentado, assim, os défices fiscais.

14. As economias com menos capacidade de regeneração não foram capazes de crescer, como seria desejável. Daí as actuais proporções muito elevadas de desemprego e uma dívida pública (e, já agora, também a privada) incomportável. São os casos de Espanha, Portugal, Irlanda e Itália. Mas, ainda poderão vir outros, mesmo até mais insuspeitos.

15. Para acertarem mais rapidamente as suas contas públicas, esses países precisam de ter capacidade para manipular mais livremente os seus instrumentos de política monetária e fiscal. E as regras definidas pelo Tratado de Maastricht não lhes dão tal margem de manobra.

16. Está, pois, lançado o repto: mantendo-se na Zona Euro, deverão obedecer às suas regras; saindo da Zona Euro, ganharão liberdade para adoptar as medidas de política monetária e fiscal que quiserem. Nesta última circunstância, iniciar-se-á, talvez, o percurso de um “funeral” – de um “funeral” que foi antes previsto por alguns. Morrerá, então, a moeda única, ela que deu maior substância ao projecto de uma Europa mais forte e mais unida. Ou então, a Europa do Euro ficará restringida à Europa dos Ricos – que, julgue eu, não será o grande sonho europeu…

17. Estou em crer que alguns economistas darão hoje razão à Grã-Bretanha, quando relutou em aderir ao Euro.

18. O défice fiscal britânico ronda os 13% do PIB – é, pois, muito elevado, tal como os países em risco. Só que o seu futuro governo terá mais liberdade para fazer opções, para tentar sair desse sufoco fiscal. Será já caso para se dizer, que “quem ri por último, é que ri melhor?

19. Outra dimensão do problema prende-se com a enorme exposição do sistema bancário mundial às dívidas dos países mais fragilizados, dívidas que podem vir a “contaminar”, de novo, a economia mundial.

20. Estaremos, hoje, então, perante a eminência de uma nova crise? Pode ser que sim. A ser assim, ela terá a particularidade de se estar a desenvolver a partir de um pequeno país como a Grécia, e não de um grande país como os EUA – os culpados pela última crise que, afinal, ainda não se dissipou totalmente.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

DE NOVO A CRISE NA EUROPA

1. Os países integrantes da União Europeia vivem hoje sob grande tensão, desde que despoletou a crise financeira na Grécia, um país que, juntamente com Portugal, integra o que já é viso como o elo mais fraco da vasta cadeia financeira que actualmente liga 16 dos 27 países da União.

2. A Eurolândia, o jargão geralmente utilizado para designar o conjunto desses 16 países – que abandonaram as suas antigas moedas nacionais e adoptaram o euro como moeda única – atravessa agora a sua maior crise desde que foi instituída há onze anos. Ventila-se agora a hipótese de uma futura desintegração, caso não seja possível imporem-se regras capazes de promover melhor coordenação das suas políticas económicas.

3. A crise grega decorre da incapacidade daquele país para saldar a enorme dívida pública que possui. Veja-se que até ao dia 19 de Maio, a Grécia terá que pagar a pesada factura de 8,5 mil milhões de euros. Caso queira sair desta crise, terá também que procurar reestruturar a sua dívida, fixando novos prazos de pagamento. Mesmo assim, esse país carece de um forte apoio financeiro internacional, por parte de países da União Europeia mas, também, do Fundo Monetário Internacional (FMI).

4. Não é descabido abordar este assunto europeu, aqui neste meu espaço de opinião.

5. Aparentemente, a Grécia fica muito distante das nossas preocupações. Porém, como o processo de integração regional, e mesmo até continental, tem merecido um crescente cuidado por parte dos actuais dirigentes políticos africanos, eu julgo que um exemplo como o da Grécia deve servir-nos como pontos de referência. E mais ainda porque, caso a crise grega se propague para Portugal e, depois, se alastre para outros países europeus, teremos então, provavelmente, um “efeito dominó” de resultados incalculáveis.

6. É um facto que as economias africanas estão muito estreitamente ligadas às economias europeias, e estão-no por vários canais: pelas importações de bens e serviços, pelos investimentos externos, pelas fontes de financiamento, pelas nossas exportações, pelas remessas dos africanos emigrados na Europa. Logo, qualquer crise que tenha lugar na economia europeia tornará ainda mais difícil o caminho para África se libertar da pobreza e do subdesenvolvimento.

7. Cresce o pessimismo em torno da crise que a Grécia experimenta, ao ponto de um investigar europeu, o director do European Strategy Forum, Peter Ludlow, ter declarado que uma falta de apoio europeu à Grécia poderá funcionar como “uma arma nuclear e levar ao desmantelamento do euro”. Esta afirmação teve como pano de fundo as resistências iniciais da Alemanha a um apoio europeu ao seu parceiro mediterrânico.

8. As últimas notícias avançam mesmo que contágios da crise financeira grega em países como Portugal, Espanha, Itália e Irlanda, jocosamente designados por PIIGS, tidos como nações periféricas na Eurolândia.

9. A contaminação dessas ditas nações periféricas da Zona Euro terá sido feita pela via fiscal, com a subida em flecha dos riscos e dos juros das dívidas desses países, que se tornaram o alvo preferencial dos especuladores. Não é, pois, por acaso, que eles hoje já exibem défices fiscais assustadores. O défice da Irlanda já vai nos 14,3%, o da Espanha 13,6%, o da Itália nos 11,2%. O défice fiscal português é, ainda assim, o menor de entre eles: 9,4%. Essas são também economias com taxas de crescimento muito reduzidas e com elevadíssimos níveis de desemprego.

10. Apresentam-se agora, pois, para cenários preocupantes, como a subida da contestação social, sob a forma de greves e outros actos de protesto, mas, igualmente, a previsão de futuras alterações no sentido de voto de um eleitorado que não aceita facilmente as propostas de solução draconianas apresentadas pelos governos nacionais e estimuladas pelas principais agências internacionais de crédito.

11. A pior solução que a Europa poderá ser, seguramente, a ruptura do Tratado de Maastricht, o Pacto que fez do Euro a moeda única europeia.

12. Um eventual retorno ao anterior cenário – o das moedas nacionais – acarretará custos económicos e sociais de toda a ordem. Terá, também, resultados políticos não calculáveis.

13. Nesta altura, as lideranças africanas que procuram seguir, muito fora do tempo, os passos dados pelos líderes europeus nos últimos 50 anos, deverão assumir uma postura mais cautelosa. Deverão fazer uma leitura mais realista do estado actual do nosso continente.