quarta-feira, 18 de março de 2015

O MEU VELHO AMIGO TONITO


1.  O meu velho amigo Tonito, de seu nome próprio, António Pascoal Fortunato, anunciou para o dia 27 deste mês de Março o lançamento de um disco intitulado “MAFUMEIRA”, integrando 11 canções interpretadas em português e em quimbundo, algumas das quais serão inéditas. De modo algum poderia ficar indiferente a tal facto, pela longa e imaculada amizade que nos liga.

 

2.  Conheci o Tonito quando comecei a trilhar os anos da minha adolescência, talvez a época mais relevante do meu percurso de vida, pois foi aí que alicercei verdadeiramente os fundamentos da minha identidade. Embora o Tonito seja significativamente mais velho do que eu, é facto que corremos mais ou menos juntos a década de 60, mantendo sempre uma relação de amizade muito salutar.

 

3.  Por isso, tive a oportunidade de acompanhar com pormenor o evoluir da sua carreira e da sua intervenção pública. Sou, pois, testemunha do desenvolvimento das suas enormes capacidades, quer artísticas, quer intelectuais.

 

4.  Recordo-me, por exemplo, do seu envolvimento nas artes: no canto, na dança, também no teatro. Eu vi o Tonito evoluir como exímio e brilhante compositor, sempre muito preocupado com a qualidade das letras das suas músicas e com a musicalidade das suas canções. Vi-o ligado a este mundo, marcando, ele também, o compasso do nosso tempo, um tempo muito marcado pelas causas que perfilhávamos.

 

5.  O Tonito introduziu-me em ambientes culturais, ajudando-me a contactar pessoas que tinham já a sua identidade mais amadurecida. Foi por seu intermédio que penetrei, por exemplo, no ambiente do Botafogo, uma associação cultural e recreativa do Bairro Marçal - o meu bairro - onde conheci figuras do mundo cultural da época, como o Catarino Barber, o Manuel Faria, entre outros.

 

6.  Com o Tonito troquei livros e até mesmo confidências de carácter político. Ele pôs-me ao corrente da existência e do percurso de nacionalistas que viviam no exterior do país. Tenho, pois, por ele, uma estima sem limites.

 

7.  Uma particularidade que nunca esqueci nem esquecerei: a nossa amizade jamais foi abalada pelos conflitos que envolveram muitos de nós no pós-independência, onde, por vezes, até as próprias famílias se dividiam em função das opções ideológicas e das visões políticas.

 

8.  Para ilustrar o seu disco, o meu amigo Tonito escolheu a designação “Mafumeira”. Acredito que o fez em homenagem ao seu simbolismo. A Mafumeira é uma planta típica das Américas, sobretudo, da América do Sul e Central, mas, também, do México e da África Ocidental. Ela é objecto de culto na mitologia Maia. Entre nós, e a fibra obtida dos seus frutos - a sumaúma - foi, inclusive, destacada num dos mais belos poemas de Viriato da Cruz, o “Namoro”:

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Sua pele macia – era sumaúma…

Sua pele macia, da cor de jambo, cheirando a rosas

Sua pele macia guardava as doçuras do corpo rijo

Tão rijo e tão doce – como o maboque…

Seus seios, laranjas – laranjas do Loge

Seus dentes… - marfim…

Mandei-lhe essa carta

E ela disse que não.

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