quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A CIMEIRA DO CLIMA

1. Aqui vai um dado revelador: as economias ditas emergentes possuem já uma taxa de crescimento do consumo de energia maior que a dos países desenvolvidos. Alto aí! Eu não disse que as economias emergentes consomem mais energia que os países desenvolvidos. O que eu disse foi que a taxa de crescimento do consumo energético é mais veloz no primeiro que no segundo grupo de países. Confundir esta leitura pode acarretar interpretações erróneas, e pode até mesmo confundir o fenómeno político e económico mundial.

2. Aqui vai mais um dado: a grande aceleração do consumo de energia verificou-se, sobretudo, em alguns países asiáticos – de que podemos destacar a China e a Índia – mas, também, em países da América Latina, com um especial realce para o Brasil, a Argentina e o México.

3. O aumento do consumo de energia é um indicador que pressagia o crescimento da economia. Se associado ao aumento de outros consumos como, por exemplo, de aço e de algumas outras matérias-primas, então, pode indiciar um processo de industrialização acelerado. Mas, há também o reverso da medalha, ou seja, determinados consumos energéticos podem ter implicações negativas sobre a preservação do ambiente, concomitantemente, sobre o futuro do nosso planeta.

4. Daí que se veja hoje como determinante a presença de certos países, – os ditos emergentes – na Cimeira das Nações Unidas que terá lugar em Copenhaga, na Dinamarca, dentro de dias. Esta Cimeira, já justamente denominada “Cimeira do Clima”, centrar-se-á exclusivamente sobre as medidas a serem tomadas para que se reduzam as emissões de gases poluentes causadores do chamado Efeito Estufa.

5. O tema do ambiente anima numerosos debates, quer pelas suas implicações políticas, quer pelas económicas, quer mesmo até no que diz respeito aos equilíbrios entre o homem e o meio envolvente.

6. Os ambientalistas – que são aqueles que possuem uma melhor percepção sobre o fenómeno e as suas implicações – estão a dar tudo por tudo, para influenciarem as decisões. O mesmo sucede por parte de alguns lobbies económicos, mais interessados geralmente nos seus resultados imediatos, nem sempre tendo em devida conta a perspectiva do longo prazo, a sustentabilidade do crescimento económico. Mas compete aos políticos casar e coordenar esses interesses contraditórios.


7. Estamos, pois, a poucos dias da abertura da Cimeira de Copenhaga, e alguns países individualmente, ou mesmo até blocos de países, vão proferindo declarações que fazem alimentar expectativas positivas sobre os resultados. Por exemplo, a União Europeia já disse que irá avançar com uma proposta de redução das suas emissões poluentes, até ao ano de 2020, na ordem dos 20% – e pode, inclusive, chegar aos 30%, caso a reunião da Dinamarca aposte num compromisso ambicioso; a Noruega foi ainda mais longe, ao propor uma taxa de redução próxima dos 40%; por sua vez, o Japão assume uma taxa de redução de 25%.


8. Antes, instalou-se o receio de um fracasso em Copenhaga, dadas as dificuldades reconhecidas de os Estados Unidos da América estarem, ou não, em condições de assumir um compromisso quantitativo, pelos seus dilemas internos. Outra grande dúvida advinha da vontade da China, actualmente o maior poluidor mundial, comprometer-se com uma qualquer taxa de redução de emissões poluentes que, eventualmente, pusesse em causa o seu espectacular crescimento económico.

9. Porém, na semana que findou, surgiram declarações animadoras. Os Estados Unidos da América deram a conhecer que avançarão com a taxa de redução de 17%, afinal, a meta que foi aprovada por uma das duas Câmaras do Congresso norte-americano, a Câmara dos Representantes, contrariando, porém, os 20% aceites pelo Senado. Na sequência de todas essas declarações, as autoridades chinesas surpreenderam o mundo ao anunciarem a disposição de reduzirem as suas emissões numa percentagem de entre 40 a 45%. Neste clima de optimismo, abrem-se agora boas perspectivas para a cimeira mundial, uma etapa crucial para a definição do futuro da humanidade e do nosso planeta.

10. São, pois, números para todos os gostos e para todos os interesses. Mas, há que ter atenção sobre o que eles eventualmente possam esconder. Por exemplo, a taxa apresentada pela União Europeia tem como referência o ano de 1990, enquanto que a taxa de redução que foi anunciada pelos EUA tem como referência o ano de 2005. Para quem é leigo, pode parecer que não é nada, mas será de facto uma diferença a não ter em conta?

11. Uma coisa é falar em emissões poluentes do ano de 1990; outra coisa é ter-se como referencial as emitidas 15 anos depois. São taxas distintas, e podem não se equivaler. Mas, essa é uma matéria para os especialistas.

12. Vejo outra diferença na linguagem que se está a usar para se anunciar a vontade de reduzir as emissões. De um modo geral, todos os proponentes falam em gases causadores do Efeito Estufa. Mas, a notícia posta a circular sobre a determinação chinesa reporta somente o dióxido de carbono. É que são vários os gases que provocam o Efeito Estufa: é o dióxido de carbono – tido justamente como o maior causador antropogénico do aquecimento global – mas é também o gás metano, o óxido de azoto, os hidrocarbonetos fluorados, os hidrocarbonetos perfluorados, o hexafluoreto de enxofre.

13. A desflorestação é outra prática que também tem grande quota de responsabilidade no aquecimento global. De tal modo que foi objecto de uma cimeira prévia, em Manaus, no Brasil, o estado brasileiro onde se instala grande parte do pulmão do nosso planeta, a floresta da Amazónia. Apela-se igualmente ao contributo dos países da Bacia do Rio Congo, assim como a Indonésia, detentores de vastas florestas.

14. O petróleo é ainda o maior participante na produção de energia – creio que ele se encarrega de 40% da produção total de energia, embora, nos últimos anos, se tenha assistido a uma derivação acentuada para a utilização do gás natural e outros combustíveis, especialmente quando se trata da geração de electricidade. Porém, no que diz respeito aos transportes, o recurso ao petróleo ainda permanece sem um substituto credível à vista. Pelo menos, para os anos que se avizinham.

15. A proposta avançada pela China, de diminuir de entre 40 a 45% das emissões de gás carbónico, até ao ano de 2020, só será factível se aquele país reduzir substancialmente o seu consumo de carvão. É que a China e a Índia possuem reservas incalculáveis deste combustível fóssil, ele que é tido como o que mais dióxido de carbono produz.

16. Para além de grande gerador de electricidade, o carvão tem também outros usos industriais. Os chineses construíram, e ainda continuam a construir, muitas centrais eléctricas que usam carvão. Presentemente, estão também empenhados na construção de inúmeras barragens hidroeléctricas, mesmo até centrais nucleares, e entraram de um modo acelerado na produção de energia proveniente de outras fontes renováveis e não poluidoras. Daí, talvez, a recente tomada de posição que surpreendeu o mundo: o grande poluidor ambiental avançou uma proposta arrojada e de grande impacto mediático. Será uma atitude sincera? Ou um mero jogo propagandístico?

17. Sobre essa e outras matérias, fica ainda muito por dizer. Não tenho tempo, nem me resta espaço, embora eu tenha de sobra uma enorme vontade de continuar a abordar este assunto que é crucial para a nossa sobrevivência, e para a existência do nosso planeta.

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