terça-feira, 20 de abril de 2010

UM TRIÂNGULO VIRTUOSO DO SABER

1. A realização de um MBA tripartido entre a Universidade Católica de Angola, a Universidade Católica Portuguesa e a brasileira Pontifícia Universidade Católica de São Paulo é um momento alto na cooperação entre os três países. Sinto-me particularmente honrado por inscrever o meu nome nesta realização de carácter académico.

2. Para um melhor entendimento do que de seguida direi, proponho-me ainda explicar o significado da expressão MBA. Trata-se de um Mestrado específico em Administração de Negócios dirigido a executivos. A sua sigla provém do inglês Master in Business Adminstration. Por norma, de um MBA constam disciplinas tais como Marketing, Finanças, Contabilidade Financeira, Estratégia, Internacionalização de Negócios, etc. Não se trata, pois, de um Mestrado académico. O Mestrado clássico é geralmente tirado por quem pretende fazer carreira no ensino, tornando-se na antessala para um Curso de Doutoramento.

3. O MBA-Atlântico que agora iniciou nas instalações da UCAN tem características específicas pois que se trata de um Curso com certificação pelas três Universidades Católicas já citadas. Ele decorrerá nos três países – com os formandos a circularem por todos eles, recebendo formação ministrada por docentes das três Universidades. Esse é o seu carácter inovador, criando um elo de solidariedade entre países com uma história comum e multifacetada. Atrevo-me a afirmar que dêmos um passo para tracejar um Triângulo Virtuoso do Saber.

4. Os laços que unem Portugal, Angola e Brasil são históricos, mesmo que nem sempre tenham sido afectuosos. Com Portugal, no passado, estabeleceu-se uma relação de subordinação e permanente conflito que acabou com a separação entre as partes. Porém, a separação de Portugal e Brasil foi muito menos traumática do que a nossa, pois foram portugueses e seus descendentes que se transformaram nos protagonistas do desalinhamento entre os dois países.

5. Estamos agora a estabelecer uma relação triangular com base no saber, o que mostra a maturidade crescente dos nossos povos e, sobretudo, das nossas elites intelectuais e científicas. Aos poucos, e mais rápido do que seria pensável há alguns anos, vamos queimando etapas. Estamos a provocar uma aceleração na história.

6. Pelo menos para alguns de nós que atravessámos certas das fases de conflito entre os nossos povos, temos agora a obrigação de limpar o caminho. Compete-nos deixar para as novas gerações uma herança de harmonia e de sã cooperação. Refiro-me concretamente aos angolanos e aos portugueses, já porque brasileiros e portugueses, e angolanos e brasileiros não têm que acertar contas recentes. Se as tiveram, foi no passado, mas o tempo encarregou-se de as saldar.

7. Tive a oportunidade de proferir algumas palavras no acto de abertura do MBA-Atlântico. Comecei por lembrar o sonho que norteou os primeiros passos para a criação, de raiz, da Universidade Católica em Angola. Felizmente, esteve presente na sala um dos iniciadores do Projecto UCAN, o Bispo de Cabinda, Dom Filomeno do Nascimento Vieira Dias. Destaquei também o facto de estarmos a conseguir realizar outro dos nossos sonhos: o de, progressivamente, transformarmos a UCAN numa Universidade respeitada e de referência. Sob todos os sacrifícios, vamo-lo conseguindo. O MBA-Atlântico é mais um elemento desse nosso crescimento e engrandecimento. Trata-se de mais uma pedra colocada nos seus alicerces.

8. O Triângulo Virtuoso do Saber que agora instituímos mostra que, com o tempo, é possível ultrapassar as relações de sujeição que se estabeleceram no passado, uma relação de sujeição em que Angola foi, indubitavelmente, a grande perdedora.

9. Ficaram para a história as memórias do Comércio Triangular que ligou Angola, Portugal e Brasil. Então, traficavam-se mercadorias e pessoas; e estas iam como se fossem meras mercadorias.

10. Ajudámos, assim, a criar as condições para que o Brasil desenvolvesse a sua economia. E Portugal, a potência colonizadora de ambos, retirou a parte de leão…

11. O Brasil é também um pouco o produto de Angola. Partiram de Angola muitos dos que lhe deram substância. Portugal é, igualmente, tributário dos aportes levados por angolanos e brasileiros. Todos nós somos, afinal, um pouco o resultado dessas múltiplas transacções que a história engendrou.

12. Feito o balanço, podemos constatar que não houve apenas perdas. Contabilizam-se, também, enormes ganhos, um dos quais é, claramente, a língua comum que falamos. Cada vez mais, a língua portuguesa é o fruto de todos os nossos contributos.

13. Somos, sim, países distantes e Estados soberanos, mas temos uma história comum e uma substância que nos identifica. Devemos saber retirar o máximo proveito disso, para o benefício de todos.

14. Devemos ter coragem de substituir recalcamentos e frustrações por laços de fraternidade e cooperação. A história, com todas as suas incidências, positivas e negativas, colocou-nos numa mesma arca, onde falamos a mesma língua. É mais fácil, pois, entendermo-nos.

15. Brasil e Angola, tão distantes geograficamente, estiveram sempre muito próximos. Foi graças a essa proximidade que se desenvolveram, por exemplo, os espaços urbanos de Luanda e Benguela. Foi destas costas que partiu o grosso dos escravos angolanos levados para o Brasil.

16. As grandes plantações de cana-de-açúcar que medraram no Brasil foram-no muito à custa de mão-de-obra saída de Angola. Zumbi dos Palmares e Ganga Zumba eram descendentes de angolanos, possivelmente saídos da região dos Dembos.

17. Eram brasileiros os cerca de 1000 soldados comandados por Salvador Correia de Sá que, em 1648, reconquistaram Luanda e Benguela aos holandeses. Na realidade, eles vinham restabelecer o circuito comercial interrompido pela ocupação holandesa.

18. Os nossos laços com Portugal são por demais conhecidos e de marca recente. Ainda hoje eles geram algumas emoções de sentido contraditório. Mas os laços com o Brasil não foram apenas no domínio comercial. Estenderam-se, inclusive, ao campo político e mesmo até religioso.

19.Na minha curta intervenção na sessão solene de abertura do MBA-Atlântico, eu recordei a dependência que se estabeleceu no passado entre a Igreja de Angola e a Igreja do Brasil, fruto do predomínio brasileiro nos negócios e na política. O predomínio brasileiro era de tal ordem que provocou a revolta dos colonos portugueses e a expulsão dos governadores brasileiros.

20. Com a publicação da Carta Orgânica de 1670 restabeleceu-se a anterior ordem colonial, passando os governadores a vir de novo de Portugal. Mesmo assim, em 1677, o Bispo de Angola e Congo passou a depender directamente do Arcebispo da Baía, no Brasil.

21. O Brasil e Portugal fazem parte da nossa história. De tal modo que, quando se dá a independência do Brasil, em 1822, o Bispo filo-brasileiro proclama em Luanda uma Junta Provisória, que mereceu o apoio do clero africano que ele criara.

22. A minha geração e as gerações mais novas têm agora a responsabilidade de criar uma fila de solidariedade e de cooperação entre os nossos três povos, numa relação em que todos podemos sair a ganhar. Por isso, eu atrevo-me a dizer que o MBA-Atlântico pode, sim, constituir o primeiro elo de um Triângulo Virtuoso do Saber.

1 comentário:

  1. Na vida tudo depende da força do "querer"
    Quando há um enorme "querer" nada é impossivel
    O MEU FORTE ABRAÇO A ESTE "QUERER"
    O MEU ABRAÇO DE CARINHO E AMIZADE A TERRA QUE
    ME VIU NASCER

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