quinta-feira, 26 de junho de 2014

UMA GEOPOLÍTICA MUITO COMPLICADA


  1. O avanço em território iraquiano das forças extremistas do denominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante, já produziu efeitos na economia mundial, a começar pela subida do preço do petróleo.


  1. Os Estados mais dependentes da importação de petróleo como, por exemplo, a Europa, serão os mais afectados pela actual crise, o que sucederá também com a China. Os seus reflexos sentir-se-ão, igualmente, sobre as economias de alguns países exportadores de petróleo, como a nossa, que aumentarão, em consequência, a sua arrecadação de divisas, não obstante virem elas também a ser vítimas da alta dos preços de outros bens, que apanharão, por tabela, os impactos da subida do preço do petróleo. Haverá como que um “efeito dominó” sobre a economia mundial, até que tudo regresse à normalidade.


  1. Todavia, uma outra questão poderá emergir desta nova situação: maior envolvimento internacional no conflito do Iraque, dadas as conexões de carácter étnico e religioso que se articulam na área geográfica em que o Iraque se situa. Vou, muito rapidamente, passar uma vista de olhos sobre esta última característica.


  1. Do ponto de vista étnico, a população do Iraque é essencialmente árabe, mesmo que também habitado por curdos e outras etnias minoritárias, como turcomanos e assírios. Se olharmos, porém, para a sua dimensão religiosa, veremos as comunidades muçulmanas repartidas por uma maioria xiita – cerca de 2/3 do total – e por uma minoria de sunitas, com aproximadamente 1/3. Para além dos muçulmanos existem, ainda, outras comunidades religiosas, como os cristãos, e até judeus. E mesmo mais confissões religiosas, porém, menos expressivas.


  1. Os curdos iraquianos – comunidades não árabes – são maioritariamente sunitas, mesmo que haja um certo número de xiitas. Os turcomanos do Iraque são praticamente todos sunitas.


  1. Pela composição étnica e religiosa dos países vizinhos do Iraque, podemos compreender melhor o porquê de alguns dos alinhamentos políticos que actualmente se verificam. Porquê que uns governos alinham como o actual governo do Iraque, e outros com os rebeldes. Certamente, com base nas suas afinidades étnicas e, sobretudo, religiosas.


  1. Do ponto de vista religioso, o Irão é um país esmagadoramente muçulmano, mesmo não sendo um país árabe. É povoado maioritariamente por persas, mas, também, por azeris, curdos, árabes e outros povos. A facção islâmica predominante no Irão é xiita, sendo os sunitas uma minoria. Os cristãos e os judeus são insignificantes nesse país.


  1. Na Síria vemos maioritariamente povos árabes, seguidos, de longe, por gente de etnia curda, turca e arménia. Trata-se ainda de um pais muçulmano com predominância do ramo sunita. Os restantes muçulmanos são alauítas – que dominam verdadeiramente o poder – xiitas e drusos. Os cristãos representam cerca de 10% da sua população.


  1. A Jordânia é um caso muito especial, pois, etnicamente, a sua população é de origem palestiniana. Nesse país há mesmo menos árabes jordanianos do que árabes palestinianos. A Jordânia, istoricamente tem sido um ponto de acolhimento da diáspora palestiniano, que já se tornou a maioria da população.


  1. A Arábia Saudita é uma peça fundamental no actual imbróglio daquela região do Médio Oriente. Nação essencialmente árabe tem também entre os seus habitantes afro-asiáticos e beduínos. Do ponto de vista religioso, é um país maioritariamente muçulmano do ramo sunita.


  1. E, como ver a Turquia? Os turcos não são árabes, mas são muçulmanos maioritariamente sunitas. A Turquia tem ainda a particularidade de possuir uma das mais activas, expressivas e reivindicativas comunidades curdos do Médio Oriente.

 
  1. Qualquer arranjo que agora se pretenda, na perspectiva da estabilização da situação explosiva que aquela região vive, tem que ter em conta estas duas importantíssimas dimensões.


  1. Uma eventual divisão do Iraque a partir dos ramos religiosos criaria, naturalmente, outros problemas para o seu futuro, e para os futuro dos restantes Estados, sendo o maior o dos curdos que ainda não abdicaram da constituição do seu próprio Estado, a partir dos territórios que ocupam que no Iraque, na Síria, no Irão, na Turquia, e até mesmo em algumas das ex-repúblicas soviéticas da Ásia.


  1. Para mim, a geopolítica daquela parte do mundo é das mais interessantes e complicadas da actualidade. Merecendo, por isso, uma grande atenção.

Sem comentários:

Enviar um comentário