quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

PARA QUE PREVALEÇA O BOM-SENSO

1. Alguns bancos norte-americanos decidiram encerrar (ou congelar) as contas das Embaixadas de 37 países (sendo 20 não-africanos e 17 africanos, entre os quais Angola), o que está a fazer correr muita tinta e a gerar polémica. No que diz respeito a Angola, tal tomada de posição foi precedida pelo anúncio dos resultados a que chegou uma Comissão do Senado encarregue de investigar movimentações financeiras julgadas ilícitas ou de carácter duvidoso. A Comissão do Senado fez, pois, referência a uma tentativa de transferência do montante de 50 milhões de usd, do erário público para uma conta privada, imputando a responsabilidade do acto ao ex-governante que, na altura, dirigia o Banco Nacional de Angola.

2. Na sequência das investigações, as autoridades norte-americanas terão ainda solicitado esclarecimentos às entidades oficiais do nosso país, não tendo sido, porém, bem sucedidas. Desconhece-se se o silêncio a que se votaram as nossas autoridades foi por negligência, ou por qualquer outra razão. Em consequência, os americanos ameaçaram bloquear as contas da nossa representação diplomática nos Estados Unidos, assim como as da Agência Nacional de Investimento Privado, ANIP, de que o Dr. Aguinaldo Jaime é o actual responsável máximo. Falou-se, também, no envolvimento de uma instituição bancária angolana.

3. Face a este quadro de pressão, e à mediatização nacional e internacional que se lhe seguiu, o Dr. Aguinaldo Jaime prestou esclarecimentos à imprensa angolana, num exclusivo concedido ao semanário Novo Jornal, tendo dito que as alegações americanas eram “perfeitamente ridículas”. E deu, então, a sua versão da história, que se resume no seguinte:

i) Que, em 2002, viera ao nosso país uma delegação de um grupo financeiro denominado “MSA Investments” mostrando-se pronto a emprestar 50 milhões de usd ao Estado angolano, a título de “ajuda humanitária”;
ii) Que o governo vira tal operação como uma oportunidade para, rapidamente, dispor de dinheiro para obras de reconstrução, já que estávamos no rescaldo da guerra civil;
iii) Que ele se apressara a buscar fórmulas para negociar as garantias capazes de suportar o negócio;
iv) Que se colocaram, pois, duas hipóteses alternativas para as tais garantias: ou pela compra de Títulos do Tesouro norte-americano (o que foi recusado pelas entidades americanas); ou por abertura de uma conta num banco americano, sendo o próprio Dr. Aguinaldo Jaime um dos signatários, para que ela pudesse ser movimentada com segurança;
v) Que para essa conta se transfeririam, então, os 50 milhões de usd cedidos pela “MSA Investments”. Uma opção que também foi rejeitada pelas entidades norte-americanas. Terá sido, pois, esta a operação que levantou as suspeitas, e que fez colocar Angola sob a mira ianque.

4. Ficou, porém, por esclarecer o porquê do posterior envolvimento da nossa Embaixada nesse imbróglio. Terá ela participado no processo da abertura da conta e posterior tentativa de transferência do dinheiro para a mesma conta? Se o fez, passou, então, a fazer parte do problema.

5. Porquê, também, que, de início, se falou na possibilidade de encerramento das contas de um banco angolano? O quê que o banco angolano teve a ver com a questão, se o signatário da conta era Governador do BNA?

6. Haverá alguma coisa mais, por detrás de tudo isso, que nós desconhecemos?

7. O que é facto é que a decisão de alguns bancos norte-americanos de encerrarem as contas da nossa Embaixada gerou reacções diversas no nosso país. Houve quem se tenha limitado a manifestar profunda consternação; houve também quem tenha assumido tal decisão como um aviso à navegação (para nos prevenirmos contra eventuais acções ainda mais graves, no futuro); por último, li (ou ouvi) autênticas manifestações de histeria patriótica, como, por exemplo, apelos a uma urgente retaliação contra os interesses americanos sedeados em Angola, a começar pelo encerramento das contas das suas empresas petrolíferas.

8. Alegadamente, as instituições bancárias norte-americanas optaram por encerrar as nossas contas, e também das outras 36 Embaixadas, por considerarem bastante onerosa a acção de fiscalização. Quanto mais duvidoso for um cliente, mais cara fica a sua relação com o banco. Numa avaliação de Custo/Benefício, suponho, os bancos terão optado por se desfazerem do cliente.

9. Penso que, no fundo, tudo se enquadra no conjunto de medidas que os americanos vêm tomando para combater eficazmente o branqueamento de capitais e o financiamento a grupos terroristas.

10. O Bank of America e os outros bancos estarão a cumprir as normas em vigor no seu país, normas que os obrigam a tomar medidas cautelares, sempre que suspeitem de alguma irregularidade grave nas movimentações bancárias dos seus clientes. Essa acção fiscalizadora implica operações onerosas para os bancos. Querem, pois, por um lado, colocar-se do lado da Lei, mas, por outro lado, desejam também afastar clientes problemáticos, ou eventualmente problemáticos.

11. A questão do branqueamento de capitais é matéria bastante melindrosa e costuma ser levada a cabo em três fases: 1ª) O dinheiro começa por ser colocado no sistema financeiro; 2ª) Depois é movido ou transferido para outras contas, através de uma série de transacções que visam ocultar a sua proveniência; 3ª) Por fim, os fundos são reintroduzidos na economia de forma a parecer que provêm de fontes legítimas.

12. Embora as autoridades norte-americanas tenham, de início, ameaçado Angola pela não apresentação de explicações das razões que levaram às movimentações aludidas pelo Dr. Aguinaldo Jaime, tudo leva, porém, a crer que a acção de encerramento (ou de congelamento) das contas é da responsabilidade dos bancos em causa, já porque, logo de seguida, surgiram outros bancos, também americanos, dispostos a alojar os dinheiros da nossa Embaixada. Além disso, as autoridades políticas daquele país predispuseram-se a tudo fazer para evitar danos ainda maiores.

13. Esta é, pois, uma questão que terá, seguramente, solução no curto prazo. Se todos mantivermos a cabeça fria… Servirá, ainda, para aprendermos, mais uma vez, que o silêncio nem sempre é a melhor solução. Sobretudo, quando a outra parte tem legitimidade para nos questionar.

14. E não vale a pena estarmos a esgrimir o preceituado no artigo 25º da Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas, pois esse artigo diz apenas que “O Estado acreditador dará todas as facilidades para o desempenho das funções da missão”. Leia-se, missão diplomática. Esta Convenção internacional não coloca, pois, ninguém acima da Lei do país acreditador. Haja, por isso, bom-senso!

1 comentário:

  1. Sou Angolano e trabalhar fora de angola, com graves problemas , por causa desse assunto , pois não só se fechou as contas da embaixada , como esta proibida qualquer movimentação de dinheiro de alguns bancos americanos para Angola, minha familia vive em angola e nos primeiros meses foi complicado enviar dinheiro para casa, agora envio porque a minha compania arranjou um banco entermediario na europa que faz com que o dinehiro chegue a angola, mais nessa ordem de ideias tive de cancelar os meus salarios no meu banco que 'e americano para receber o salario em angola , num sistema bancario , pobre , sem grandes ofertas, com milhoes de problemas de operacoes e o mais grave , sem sigilio profissional nenhum. Nao sei onde vamos parar assim

    ResponderEliminar