terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A ÁFRICA DO SUL E AS OPORTUNIDADES QUE SE ABREM

1. O Chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, realizou neste mês de Dezembro a sua primeira visita de Estado à África do Sul, tendo despertado uma expectativa que, pelo menos em parte, se viu correspondida.

2. Pouco antes do início da visita, e no decorrer da mesma, políticos, técnicos, e até populares teceram diversos pronunciamentos a propósito. Reparei que a generalidade das pessoas tendeu para manifestar esperança de ver melhoradas as relações entre os nossos dois países, tanto no domínio económico, como no domínio político. Quase todos foram também expressando o desejo de ver mais facilitado o acesso dos cidadãos de cada um dos Estados ao Estado parceiro, numa base de reciprocidade. Não dei conta de alguém se ter pronunciado em sentido contrário, o que demonstra crescente maturidade e, sobretudo, uma perfeita percepção dos interesses que estão em causa.

3. Escutei, porém, algumas opiniões, no mínimo, estranhas como, por exemplo, a de alguém que afirmou que as autoridades sul-africanas estariam a ser ingratas, ao não expressarem, publicamente, gratidão pelo papel que Angola jogou no combate ao regime do apartheid. Que eu saiba, qualquer um dos dois anteriores Chefes de Estado sul-africanos jamais manifestou tal lapso de memória… Na realidade, eles não fizeram dessa questão um tema recorrente nos seus discursos oficiais, o que faz perfeito sentido, dado que há também outras questões importantes a abordar e em busca de soluções.

4. Sobretudo os nossos empresários falaram muito da necessidade do incremento das trocas comerciais, dos investimentos recíprocos, da transferência de tecnologia e, claro, da melhoria na circulação das pessoas. Todos reconheceram o prestígio político e a potência da economia sul-africana, destacando o seu peso no contexto da nossa sub-região austral. É, sobretudo, a última questão que merece agora a nossa atenção, uma vez que a competitividade entre os países se mede pelo que eles são capazes de criar e vender.

5. Para podermos avaliar a importância da África do Sul, comecemos, pois, por dar uma olhada para o seu Produto Interno Bruto. Com base nesse indicador, a economia sul-africana ocupa a 26ª posição na economia do mundo, sendo bem distribuída por sectores, o que lhe garante equilíbrio e sustentabilidade. Por exemplo, a agricultura sul-africana participa com cerca de 4% na formação do PIB, a indústria concorre com 31%, e os restantes 65% são da responsabilidade do sector comercial.

6. A sua relativamente forte base industrial pode ser analisada a partir do seguinte dado: mais de ¼ do total da força-de-trabalho está empregue em actividades de carácter industrial, com o sector agrícola a empregar apenas 9% dessa força-de-trabalho. A estrutura do emprego contrasta fortemente com a imagem característica da maioria dos países africanos, tendencialmente mono produtores, muito mergulhados numa agricultura de quase subsistência, e com o grosso da força-de-trabalho disponível dedicada a actividades comerciais informais.

7. A tendência para a mono produção em certos países africanos, tem sido muito estimulada pela procura crescente de produtos de origem mineral. Isso tem criado enormes distorções económicas, desviando a atenção e o seu cuidado de outras actividades, com implicações negativas de carácter social e político. Muito da instabilidade social e política que a África hoje vive decorre, pelo menos em parte, dessa circunstância.

8. Uma das pessoas que se pronunciou publicamente sobre as vantagens de se melhorar as relações económicas com a África do Sul, o empresário Carlos Cunha, realçou, por exemplo, a importância do sector agro-pecuário, no qual os sul-africanos detêm tecnologia própria e chegam a obter rendimentos médios por hectare bastante assinaláveis, mesmo ao nível dos países mais avançados. Tais bons proveitos derivam da existência do clima moderado, da fertilidade dos solos e das tecnologias adaptadas ao meio.

9. O empresário Carlos Cunha recordou, então, que os zootécnicos daquele país criaram, por exemplo, uma raça bovina tipicamente sul-africana, o bonsmara, um boi bastante resistente, adaptado a pastagens pobres e a temperaturas elevadas. É já a raça de corte mais disseminada na África do Sul. Resultou do cruzamento do gado africâner (em 5/8) com o gado britânico (hereford e shorthorn, em 3/8), e alia a rusticidade do gado africâner à alta produtividade do gado europeu. Possui elevada taxa de conversão alimentar, muito bom rendimento da carcaça e precocidade sexual.

10. O bonsmara está já disseminado um pouco por todo o mundo, pois está a ser criado em países tão distantes como o Brasil – o segundo país com maior efectivo desse gado – Austrália, Canadá, Estados Unidos, Argentina, Paraguai, Colômbia, Namíbia e Zimbabwe. No início deste mês de Dezembro, durante um encontro de criadores brasileiros dessa espécie bovina, em São Paulo, no Brasil, foi divulgado o resultado da primeira avaliação genética internacional do bonsmara. O bonsmara também já franqueou as nossas fronteiras e o efectivo tem tendência para o crescimento.

11. Tal como Angola, a África do Sul possui assinaláveis concentrações de produtos minerais. É rica em ouro e diamantes, mas, igualmente, em urânio, platina, crómio, manganês, ferro, vanádio, antimónio e titânio. Possui ainda enormes concentrações de carvão, um produto que é seguramente responsável pela maior parte da produção de energia desse país, e que motivou uma forte e já antiga corrente migratória a partir dos países vizinhos. Moçambique, por exemplo, depende muito das remessas dos seus emigrantes que trabalham nas minas de carvão sul-africanas.

12. Eu sou um grande apreciador de reportagens sobre as belezas da natureza. Por isso, não dispenso documentários sobre os parques de animais selvagens que a África em geral ainda possui, e de que a África do Sul, juntamente com o Quénia serão, talvez, os expoentes máximos. O Parque Nacional Kruger, situado na África do Sul, é considerado das maiores reservas de mamíferos do mundo, possuindo os tradicionais “big five”: leões, leopardos, elefantes, rinocerontes e búfalos. Estas e outras belezas naturais potenciam o turismo sul-africano, que se transformou numa das principais fontes de receita do país. Temos, pois, a aprender muito com esse país, nesse domínio, e em outros que vale a pena pesquisar.

13. A perspectiva aberta com a vista de Estado de José Eduardo dos Santos à África do Sul não pode ser menosprezada, sob pena de perdermos oportunidades que outros, talvez mais expeditos, seguramente não desperdiçarão.

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