1. É quase inquestionável a
possibilidade de a actual “crise petrolífera”, decorrente da acentuada baixa do
preço do petróleo no mercado internacional, se vir a manter nos próximos anos, por
causa da descoberta de novas reservas, um pouco por todo o mundo, e também pela
cada vez maior diversificação de fontes alternativas ao seu consumo.
2. É bom, porém, dizer que a expressão
“crise petrolífera” tem praticamente um único sentido, o sentido em que estão
situados os países produtores mais dependentes das suas receitas. É aqui onde
se localizam países como, por exemplo, a Nigéria, Argélia, Venezuela, Iraque,
Angola, Líbia, etc. Mas, igualmente, a Rússia, importante na cena
internacional, porém, demasiado dependente das receitas provenientes dessa
matéria-prima.
3. Casos como EUA, Canadá, Brasil, Reino
Unido, ou Noruega, grandes consumidores/grandes produtores, pouco ou nada
dependem das receitas de exportação de petróleo, para o equilíbrio das suas
balanças comerciais. Os preços baixos desta matéria-prima afectarão, sim, as suas
multinacionais espalhadas um pouco por todo o mundo. Esse ônus recairá sobre
si, competindo-lhes, por isso, encontrar soluções capazes de melhor rentabilizar
o seu negócio. Mesmo que as suas receitas globais se estreitem, o impacto na
economia dos seus países de origem pode até passar desapercebido, tão vastas e
tão múltiplas são essas economias.
4. A “crise petrolífera” dos nossos dias
beneficia os restantes países, sejam eles grandes ou pequenos consumidores. Os
grandes consumidores/não produtores, como a França, Alemanha, ou a Itália, por
exemplo, saem a ganhar, pelos preços baixos da importação do petróleo e pelos
lucros das suas multinacionais que exploram esse produto nos diversos
quadrantes do mundo. Os grandes produtores/pouco consumidores, a exemplo dos
países do Médio Oriente, pouco ou não sentirão os seus impactos, têm almofadas
financeiras bastante confortáveis. Os países pouco desenvolvidos e importadores
de petróleo ganham claramente com os actuais preços.
5. Em resumo, esta é uma “crise” que não
é para todos. Para alguns - e não são poucos - ela é mesmo uma “bênção”. O
resultado a obter por cada um dependerá do seu papel no complicado xadrez.
6. A geopolítica do petróleo tem estado
muito ligada ao Médio Oriente e à OPEP, e tem sido objecto de uma leitura
dicotómica: países produtores/países consumidores; países desenvolvidos/países
pouco desenvolvidos; países industrializados/ países pouco industrializados.
7. Desenha-se agora uma nova
configuração mundial, com a descoberta de novas reservas, quer as provenientes
do xisto norte-americano (que também existe em outras partes do mundo), quer as
areias betuminosas do Canadá, bem como o pré-sal do Brasil e o óleo pesado da
Venezuela. Requerendo todas elas processos inovadores de exploração, pela
certa, provocarão reestruturações e uma nova dinâmica regional e mesmo mundial.
8. O consumo diário mundial de petróleo
ronda agora os 92 milhões de barris de petróleo, um valor ligeiramente superior
ao do ano anterior. O crescimento do consumo tem sido especialmente devido a
países antes tidos como periféricos, não pertencentes à OCDE. São, por exemplo,
a China e a Índia e mais alguns países asiáticos os principais motores do
crescimento da economia mundial (que deverá rondar este ano em cerca de 3,6%)
e, também, as grandes alavancas do consumo de petróleo.
9. Tal como temos assistido a uma
alteração estrutural no consumo, existe igualmente uma alteração estrutural na
produção, com perda de influência relativa por parte da OPEP, e o aumento da
oferta a provir essencialmente de países fora da OPEP.
10.
Angola prevê atingir a meta de 2 milhões de barris/dia em 2016 e manter
esse nível de produção nos 5 anos seguintes. Não obstante tal previsão de
crescimento da produção de petróleo, os actuais baixos preços internacionais
dificilmente serão compensados pelo aumento da produção. Crê-se mesmo que os
preços poderão baixar, caso o Irão retome a sua posição na oferta mundial de
petróleo. Trata-se de um país com imensas reservas e que constituiu “stocks”
que poderá lançar no mercado, depois de levantadas as sanções internacionais
que lhe foram aplicadas.
11.
Pelo menos, pelo discurso oficial, Angola pretende alterar o seu rumo, com
os responsáveis da Sonangol a falarem em reduzir os seus custos de
desenvolvimento e os seus custos operacionais. É uma boa notícia. Contudo, os
sinais vindos de algumas empresas vinculadas à exploração do petróleo angolano
não são os mais animadores. Ouve-se falar em redução do seu nível de
actividade, com implicações sérias sobre o volume de emprego. Trabalhadores
angolanos começam a ser dispensados.
12.
Não obstante a queda do preço do barril de petróleo, a Total - a
multinacional francesa que emprega cerca de 2.000 trabalhadores angolanos (50%
do seu efectivo) - manifesta a intenção de não reduzir a actividade em Angola.
Alega que os seus custos de produção rondam os usd 30, um valor ainda assim
recompensador face aos actuais baixos preços.
13.
A recente visita a Angola do Presidente francês, François Hollande, veio
reforçar essa posição, inclusive, com o anúncio de novos investimentos. Mas é
preciso compreender isso, pois a França é um dos países industrializados mais
dependentes da importação de petróleo e, nalguns casos, de petróleo proveniente
de regiões demasiado instáveis, quer em África, quer no Médio Oriente.
14.
A promessa francesa de desenvolvimento da sua actividade no nosso país
pode, porém, colidir com a nossa capacidade de resposta ao desígnio
governamental de crescimento da política de “angolanização” no sector.
15.
O processo de “angolanização” deve ser visto em duas perspectivas: por um
lado, o aumento do número de angolanos nas companhias que operam no nosso país;
por outro lado, o desenvolvimento de empresas participadas por angolanos,
integradas no vasto tecido que envolve a actividade petrolífera.
16.
Sendo este sector cada vez mais dinâmico, objecto permanente de inovações
e de aplicação de novas tecnologias, a questão que se coloca é a de sabermos se
temos velocidade suficiente para nos dotarmos de quadros competentes para
rivalizarem com os concorrentes estrangeiros, uma vez que as empresas estarão
cada vez mais sujeitas à competição entre si. É que quem se atrasar na inovação
e na capacitação dos quadros, perde terreno. E quem perder terreno, falece.
17.
Mesmo com o demasiado “suporte externo” recentemente declarado pelo PCA
da Sonangol, ficou claro que ela se tornou muito ineficiente. Um “suporte
externo” exagerado que, inclusive, ao longo destes anos, subalternizou os
quadros nacionais formados e empregados pela companhia.
Sem comentários:
Enviar um comentário