quinta-feira, 1 de outubro de 2015

O ÓNUS DA DESVALORIZAÇÃO DO YUAN


1.  Escrevi, nos últimos dias, um artigo de opinião no qual abordei a questão da eventualidade de a moeda chinesa, o yuan, vir a circular livremente nosso país. A acontecer, decorrerá de um “Acordo Monetário” a ser firmado entre a China e Angola. Descrevi, então, duas razões fundamentais para que tal venha a suceder: i) a crescente importância da economia chinesa na arena internacional; i e a expansão do yuan, que tem vindo a conquistar cada vez maior espaço no comércio mundial.

 

2.  A expansão do yuan no comércio mundial aconteceu em simultâneo com a sua valorização face ao dólar, traduzindo-se numa poupança nas transações comerciais com a China. Mas, agora, o Banco Popular da China optou por desvalorizar o yuan, em cerca de 2%, e novamente em mais 1,6%. No mercado chinês, o yuan perdeu valor em cerca de 3,6%, mas, nos mercados globais, a perda foi ainda maior, atingindo os 4,8%. Trata-se, pois, da maior desvalorização da moeda chinesa nos últimos 20 anos.

 

3.  Um dos principais questionamentos ao modelo monetário chinês prende-se precisamente com o facto de as autoridades chinesas puderem manipular livremente a sua taxa de câmbio, ganhando, assim, vantagens sobre as economias cujas taxas de câmbio flutuam em função das regras do mercado.

 

4.  O modelo chinês de estabelecimento da taxa de câmbio funciona nos seguintes termos: Todos os dias, pela manhã, o Banco Popular da China anuncia um valor médio para a sua moeda, e é em torno deste valor médio que ela se pode apreciar ou depreciar, até ao limite de 2%. É nem mais nem menos que um sistema de bandas.

 

5.  Com o actual ajustamento de 3,5%, o preço médio desceu, pois, para um nível mais baixo, a partir do qual agora se realizarão as flutuações. A acção das autoridades chinesas provocou turbulência nos mercados, com as bolsas a reflectirem os receios dos investidores, para quem a economia chinesa estará, afinal, a portar-se muito pior do que antes se supunha.

 

6.  Quando se tornou perceptível o mau desempenho da economia chinesa, levantou-se a hipótese de a autoridade monetária optar por estimular a economia pela redução do nível das reservas mínimas obrigatórias dos bancos comerciais junto do Banco Central. Uma medida que complementaria, por exemplo, outras de carácter orçamental. Mas, a China optou por desvalorizar fortemente a sua moeda, seguramente com vista a aumentar o nível das suas exportações, tornando-as mais competitivas.

 

7.  É hoje sabido que a perda de competitividade das exportações chinesas não decorre apenas do nível da sua taxa de câmbio. Nos últimos tempos, os seus custos de produção aumentaram significativamente, em especial pelo aumento do custo da força de trabalho. Os trabalhadores chineses começaram a ser mais exigentes, reivindicando já por melhores salários.

 

8.  As autoridades vêem reduzido o seu campo de manobra, para limitar tais aumentos, temendo reacções em cadeia por parte da classe trabalhadora. Com esse cenário, poderá, pois, estar a aproximar-se o momento em que algumas empresas sedeadas na China se comecem a deslocalizar para outros países com custos de produção mais baixos, e com leis laborais mais rígidas. Consequência imediata para a economia chinesa: perda de empregos. Outra consequência previsível: contestação social de que não é fácil adivinhar os limites.

 

9.  A política de baixos salários - que foi a tónica do processo de crescimento da economia chinesa - tem, pois, limites. Se é verdade que ela foi muito atrativa ao investimento, não deixa de ser verdade que tem o reverso da medalha: retrai o poder de compra interno. É ponto assente que uma economia como a chinesa não se pode apoiar apenas nas exportações. Ela tem que assentar também numa grande capacidade de consumo interno.

 

10.      Embora a China tenha ainda hoje a maior população do mundo, “a política do filho único” retraiu o seu crescimento demográfico. Talvez por causa disso, se esteja já a preparar uma nova política, a “política de dois filhos por cada casal”.

 

11.      Será que Angola sentirá os impactos da actual desvalorização do yuan? Claro que sim. Se utilizar o dólar na compra de bens e serviços no mercado chinês, eles ficarão mais baratos, por causa da maior cotação do dólar. Porém, quando estiver a receber em yuan, os preços das suas exportações para a China (creio que apenas de petróleo), então, estará a perder dinheiro.

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