quinta-feira, 1 de outubro de 2015

AS CRISES QUE SE REPETEM


1.  A economia mundial vive, novamente, sobre o “fio de navalha”, desta vez, fruto do rebentamento da “bolha chinesa”, uma “bolha” que traz à memória a ainda não muito distante “bolha imobiliária” que estoirou nos Estados Unidos da América, no ano de 2008 - desencadeando ondas de choque um pouco por todo mundo – mas, também, a já mais longínqua “bolha japonesa” da década de 1990. Vale, pois, a pena recuarmos um pouco no tempo para percebermos algumas semelhanças entre “o antes” e “o agora”.

 

2.  Foi a “bolha especulativa japonesa”, da década de 1990, que pôs fim ao chamado “milagre económico japonês”. Pela sua expressão e importância, este “milagre económico” marcou uma boa parte da segunda metade do século XX, dado que o Japão saía de uma guerra de enorme devastação, a II Guerra Mundial, em que tinha alinhado ao lado da Alemanha Nazi e a Itália Fascista. Em relativamente pouco tempo, recuperou a sua economia, guindando-se à categoria de grande potência económica mundial. A partir de 1990, porém, sofreu um forte abalo económico, de que falarei de seguida.

 

3.  A “bolha especulativa japonesa” foi, de algum modo, um resultado da perniciosa articulação entre empesas japonesas e o seu sistema bancário. Segundo opinião do economista norte-americano Paul Krugman, “os bancos japoneses concederam créditos ao desbarato, sem atender à qualidade dos devedores”, um facto gerador de “uma bola económica de proporções grotescas”. Na tentativa de controlar a situação (a inflação propagou-se), o Banco Central do Japão optou por aumentar drasticamente as taxas dos empréstimos interbancários, causando a explosão da “bolha”.

 

4.  O mercado acionista japonês ressentiu-se, sofrendo enormes quebras, arrastando consigo os bancos e as companhias de seguros. O governo japonês interveio injectando liquidez no sistema financeiro facilitando os empréstimos aos bancos comerciais e concedendo crédito barato. Não obstante este fluxo financeiro, muitas empresas foram falindo, causando a estagnação do Produto Interno Bruto do país, por cerca de duas décadas. Sobreveio o desemprego e/ou aumentou a precariedade do emprego. Empresas emblemáticas na economia japonesa, como a Toyota ou a Sony, passaram a confrontar-se com a forte concorrência de rivais no Leste Asiático, especialmente da Coreia do Sul.

 

5.   Durante cerca de 12 anos, fruto da estagnação do PIB japonês, a economia recuou face às da França, Reino Unido, Alemanha e Canadá, por exemplo. O PIB per capita também se degradou, bem como a eficiência laboral – até então uma das suas grandes imagens de marca.

 

6.  Face à deflação – queda dos preços - e ao baixo crescimento económico, as autoridades japonesas optaram por estimular a economia, aumentando o défice fiscal e criando uma maior pressão sobre a dívida pública, tornada das maiores do mundo. (A dívida pública japonesa tem a característica particular de ser contraída essencialmente no mercado doméstico e no Banco do Japão). É, também, neste período que a economia japonesa perde terreno face à chinesa - entretanto em rápido crescimento - ascende à posição de segunda economia mundial.

 

7.  A “bolha especulativa norte-americana” inicia com a chamada “crise do subprime”, catalogada por alguns como tendo começado em 2006, e, por outros, em 2007, a altura em que foi, de facto, revelada.

 

8.  A “crise do subprime” decorreu da concessão de empréstimos hipotecários de alto risco que levaram à falência de instituições financeiras, repercutindo-se depois sobre as bolsas de valores de praticamente todo o mundo. Esta crise é hoje tida como a mais perigosa depois da de 1929, o prenúncio da “crise económica de 2008”.

 

9.  O “subprime” consistiu na concessão de crédito a famílias e a indivíduos sem histórico ou com um histórico ruim, também sem emprego ou com rendimento inadequado. Tal sistema funcionou enquanto o valor do imobiliário permaneceu em alta, permitindo aos mutuários renovar os empréstimos, para liquidar os empréstimos anteriores, dando os imóveis como garantia. Com a subida das taxas de juro e a quebra no preço dos imóveis, as famílias e os indivíduos tornaram-se inadimplentes, gerando a insolvência dos bancos. Em consequência, as autoridades norte-americanas tiveram que intervir, injectando liquidez no sistema financeiro e, inclusive, intervencionando algumas empresas em crise – política nada do agrado dos sectores políticos mais conservadores. Porém, os Estados Unidos da América conseguiram sair da crise, com o mundo a respirar de alívio. Um alívio que, pelos vistos, foi de muito curta duração…

 

10.                  A crise está de volta. Desta vez, e novamente, a partir da Ásia, mais precisamente da China, com as autoridades monetárias chinesas a tentarem minorar a crise com medidas idênticas às que já antes haviam sido tomadas, quer pelas autoridades japoneses, quer pelas norte-americanas, na época das suas respectivas crises: injeção de liquidez no sistema, redução das taxas de juro, redução dos níveis das reservas obrigatórias dos bancos. Ainda a desvalorização da moeda nacional, o yuan, como expediente para aumentar a competitividade das exportações e redução das importações.

 

11.                  A economia chinesa esteve sobreaquecida durante muito tempo, em alguma medida devido a factores pouco ortodoxos: um mercado acionista que viveu muito à custa de dinheiro emprestado pelo sistema. Segundo a consultora britânica “Capital Economics”, de Londres, somente 2% das acções no mercado chinês são detidas por estrangeiros. Os restantes 98% estão em posse dos investidores locais, numa autêntica “popularização das acções”. O modelo chinês procurou, pois, assentar numa espécie de “capitalismo popular”, com acesso fácil ao crédito bancário, por parte das empresas e cidadãos. Com a desaceleração da economia, um bom número de investidores locais viu-se, pois, obrigado a desfazer-se das suas acções para pagarem as dívidas contraídas, o que aprofundou ainda mais a crise.

 

12.                  Sendo a China a segunda maior potência económica do mundo, uma grande potência exportadora e, também, uma grande potência importadora de “commodities”, os reflexos da “sua crise” estão já a fazer-se sentir um pouco por todo o lado. E os países exportadores de petróleo, como Angola, por exemplo, de modo algum se verão livres dos seus impactos…

Sem comentários:

Enviar um comentário